A turminha Decide.

A turminha decide

Tempo na balança e no pula-pula bem como os dias de brinquedo são exemplos de decisões tiradas em assembléias por crianças de até quatro anos
Débora Menezes

Na Escola de Educação Infantil Teia Multicultural, na zona Oeste de São Paulo, crianças pequenas no tamanho (elas têm quatro anos), mas grandes na autonomia, já tomam decisões sobre o que querem ou não querem em seu cotidiano escolar. Uma das filosofias da instituição, que pertence à rede particular da capital, é realizar assembléias nas quais os alunos chegam a soluções coletivas para conflitos e expressam os seus desejos.

Representantes da Teia participam da 15ª Conferência de Educação Democrática, em Mogi das Cruzes (SP). O encontro debate princípios de uma educação que abra espaço para que os alunos sejam protagonistas e tenham liberdade de escolha (leia mais). No quinto dia de evento, um dos temas de discussão foi justamente a autonomia na Educação Infantil.

A Teia Multicultural levou alunos ao plenário e transmitiu sua experiência sobre a relação entre professores e a garotada na construção coletiva de regras de boa convivência. Entre os temas debatidos e decididos em assembléias, lembra a diretora e pedagoga Georgya Correa, está o “dia do brinquedo”. A questão para a discussão era: “podemos levar brinquedos diariamente para a escola ou vamos escolher um dia específico para isso”? O consenso foi que um dia seria suficiente. “Tomando decisões por meio de muitas conversas eles vão aprendendo a lidar com as situações do dia-a-dia e passam a entender suas responsabilidades”, diz Georgya.

Outro tema de uma das assembléias na Teia: a balança e o pula-pula são os brinquedos mais concorridos do parque. O que fazer para que todas as crianças brinquem neles na hora do recreio? A solução dos pequenos alunos: estipular um tempo para cada criança brincar, contado pelas batidas do coração.

Para a pesquisadora Marina Letícia Nascimento, especialista em sociologia da infância na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), esses são exemplos positivos de como as crianças constroem sua autonomia. “Elas precisam ter oportunidade de fazer escolhas e nem sempre isso acontece na escola. Nossa tendência é superprotegê-las e decidir por elas”, explica a educadora, que concluiu sua fala lembrando: é negociando que as crianças vão desenvolver suas competências e é fazendo-as construir regras, não apenas impondo-as, que os pequenos terão mais respeito não só aos adultos, mas entre si.

Alunos com poder

De um lado, uma escola onde os alunos têm o poder de selecionar ou até mesmo demitir professores. De outro, uma instituição onde os pais participam do planejamento político pedagógico. As duas experiências, uma nos Estados Unidos e outra em São Paulo, foram apresentadas no debate “Seleção e Avaliação Democráticas de Profissionais da Educação”.
Em Santa Fé, no sul dos Estados Unidos, a Tutorial School tem um sistema diferenciado de outros estabelecimentos de ensino. Não há um currículo formal a ser seguido; são desenvolvidos programas de pesquisa seguidos pelos aluno, cada qual no seu ritmo. No dia-a-dia, todos são apoiados (e não cobrados) pelos professores. Os estudantes também realizam assembléias para decidir sobre as regras da escola e têm o seu próprio comitê para selecionar professores e até mesmo sugerir demissões. No final de cada ano, os educadores também são avaliados pelos alunos.

A idéia é que esses princípios garantam um ambiente não-autoritário, sem clima de medo, onde os alunos têm mais condições de se envolver com os estudos e conviver em harmonia.
Se você acha que essa liberdade é desfrutada de forma enviesada pelos alunos, veja o comentário do professor Moe Zimmerberg: “Uma das coisas mais difíceis é aprender a decidir. Mas ter essa responsabilidade é a melhor forma de desenvolver o auto-conhecimento desses estudantes”. Os pais têm papel importante nesse processo, segundo a filosofia da escola: “os jovens aprendem a ter responsabilidade somente quando seus pais adotam uma política de não-interferência. Pais precisam aprender a confiar quando seus filhos tomam suas próprias decisões, mesmo se os próprios pais não concordam com elas”.

Autonomia na gestão

Na Escola Municipal de Ensino Fundamental Amorim Lima, na zona Oeste de São Paulo, a busca pela autonomia alcança não só os alunos, mas também os pais. Após anos de evasão e indisciplina, a escola, com 800 estudantes, transformou seu ambiente em salas de aula sem paredes, implantou um currículo sem exames finais e um conselho escolar atuante, espaço para o conhecimento e o debate do plano político pedagógico pelos pais.

Tão forte é o conselho, que a escola se uniu a outras Emefs – Presidente Campos Salles, Gabriel Prestes e Olavo Pezzotti – para propor à Secretaria Municipal de Educação a criação de uma rede de autonomia em São Paulo. A proposta está sendo discutida e melhorada e prevê que as unidades participantes tenham conselhos igualmente fortes, dando espaço para que a comunidade participe das decisões. Outra reivindicação é que as escolas tenham autonomia até mesmo para fazer a própria gestão financeira e selecionar novos educadores para a equipe. “Não queremos grandes revoluções, apenas mais liberdade de atuação”, afirma Luis Braga, presidente do conselho da Amorim Lima.