Revolução no Ensino

O Estado de São Paulo, 13 de maio de 2004

Revolução no ensino

Numa escola municipal crianças estudam em grupos de 5, ouvem música clássica e decidem quando serão avaliadas
RENATA CAFARDO

As paredes foram derrubadas e surgiu um amplo e claro salão que uniu as três turmas de 5.ª série. A mudança física simboliza bem a reviravolta vivida pela escola municipal Amorim Lima. Com os tijolos, foram embora provas, aulas expositivas, o foco na figura do professor. As crianças agora estudam em grupos de cinco, ouvem música clássica na aula e escolhem quais atividades farão na semana. A avaliação? Só quando elas se dizem prontas.
A inspiração veio da Escola da Ponte, instituição portuguesa de 28 anos que recentemente começou a conquistar admiradores por aqui. A idéia é a de que cada criança tem seu ritmo diferente de aprendizagem. Lá, os objetivos, tarefas e deveres dos alunos são decididos por eles mesmos numa assembléia, não há salas de aula, nem séries. Quem vê de fora, a chama de escola democrática, apesar de seu fundador, José Pacheco, preferir o termo cidadã.
“O professor não passa a ser dispensável, ele ganha outras atribuições.
Ajuda a criança a definir objetivos, procura bibliografia para orientá-la, não dá a resposta”, diz Pacheco. Na Amorim Lima – que fica no Butantã e é primeira escola pública a adotar o método -, as professoras estão aprendendo a se tornar polivalentes. São 3 à disposição de 105 alunos num mesmo salão, realizando atividades de diferentes disciplinas. Nenhuma delas está na frente da classe, falando alto, ditando a lição. Passam pelos grupos, tirando dúvidas. “A gente consegue acompanhar o raciocínio da criança enquanto explicamos”, diz a professora Geise Grangeiro Costa.
Pela escola, vê-se grupos de estudantes fora das salas. Uns em aulas de educação ambiental, outros, de teatro. “A gente tem de pegar os livros sozinho, aprender a ser responsável”, diz Cynthia Lima, de 11 anos, enquanto estuda pinturas rupestres. Em uma ficha, ela anota em quanto tempo consegue aprender cada tópico. Quando Cyntia se considerar pronta, a professora fará a avaliação individual. “Tem muito barulho na classe”, reclama sua colega Pamela Pires. Do alto-falante sai uma música suave. “É para ajudar na nossa concentração”, explica Jorge Figueiredo, de 10. “Prefiro rock”, emenda André de Almeida. E volta para o exercício de matemática.
O projeto começou este ano só com as 1.ª e 5.ª séries. Os alunos ainda se acostumam com a novidade, mas a mudança foi proposta pelos próprios pais – orientados pela psicóloga Rosely Sayão. A diretora Ana Elisa Siqueira visitou a Escola da Ponte e é uma das grandes defensoras do modelo. “Não há mais aula vaga. Se falta um professor, o aluno continua a atividade porque tem autonomia”, diz Regina Chaves, mãe de dois alunos.
A secretária municipal de Educação, Cida Perez, também aprova o projeto. O que mais agrada aos educadores é o fato de a proposta lembrar o sistema de ciclos, no acompanhamento individual do aluno e nas avaliações contínuas.
Até então apenas a escola particular Lumiar, na capital, tinha o mesmo perfil. Outras, como as que fazem parte da Pueri Domus Escolas Associadas, tentam introduzir algumas inovações no modelo convencional. A proposta, no entanto, surgiu nos anos 20, com a escola inglesa Summerhill. Depois de mais de 70 anos, ela foi fechada e especula-se que um dos motivos foi a expulsão dos professores pelos próprios alunos.