Amorim Lima é referência no Brasil segundo o site El País

A versão brasileira do site El País fez uma matéria muito boa sobre a Amorim Lima contando como ela se transformou em uma referência no Brasil.

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O texto mostra como aulas ao ar livre, salas multisseriadas, roteiro de estudos flexível e pais na gestão de atividades culturais entre tantas outras ações de nossa escola a colocou no Mapa da Inovação e Criatividade do Ministério da Educação.

Leia a matéria na íntegra.

Amorim Lima está na revista Superinteressante

Escolas do Futuro: elas já existem! É isso o que conta a reportagem da revista Superinteressante, na edição de fevereiro de 2013. Os repórteres pesquisaram escolas que já aplicam formas diferentes de estimular o conhecimento em seus alunos. E a EMEF Desembargador Amorim Lima é uma das nove escolas citadas. No Brasil, além do Amorim, a reportagem cita a Politeia. A Escola da Ponte, em Portugal, modelo inspirador para o Amorim Lima, também entrou na reportagem. Leia a reportagem completa.

Capa da revista Superinteressante que tem a reportagem sobre as Escolas do Futuro. O Amorim Lima está lá!

As outras escolas citadas na matéria são:

Minddrive, nos Estados Unidos
Green School, na Indonésia
Vittra, na Suécia
Juku e Hagwon, no Japão e Coreia do Sul
Harvey Milk High School, nos Estados Unidos
Kahn Academy, aulas em vídeo de Salman Khan no Youtube

No ano passado, o Amorim Lima também foi tema de reportagem na revista Bons Fluidos.

Abertura da reportagem sobre as escolas do Futuro, da Superinteressante
Na reportagem da Superinteressante, a EMEF Desembargador Amorim Lima é uma das nove "Escolas do Futuro"
Reportagem da Superinteressante sobre as Escolas do Futuro. Oba! O Amorim Lima é uma delas

Você tem perfil no Facebook? Oba! Curta a fanpage do Amorim (www.facebook.com/EMEF.Desembargador.Amorim.Lima) e receba as notícias da escola.

Alunos do primeiro ano do Amorim Lima participam de curta-metragem

Para assistir a um pequeno trecho do documentário e saber como ajudar no projeto, clique aqui.

Cena do documentário que está sendo produzido no Amorim Lima com os alunos do primeiro ano matutino
Cena do documentário que está sendo produzido no Amorim Lima com os alunos do primeiro ano matutino
Desde o começo de 2012, estudantes de cinema da FAAP têm filmado os alunos do primeiro ano, do período da manhã, da EMEF Desembargador Amorim Lima. Eles estão produzindo um curta-metragem documental que aborda alternativas de métodos de ensino para a educação pública.

Cena do documentário que está sendo produzido no Amorim Lima com os alunos do primeiro ano matutino
Cena do documentário que está sendo produzido no Amorim Lima com os alunos do primeiro ano matutino

Entre as atividades mostradas no filme estão as de alfabetização e a de Arte com Ciência, oficina especial oferecida pela arquiteta Massumi e pela veterinária Vânia. Por meio das atividades observadas cotidianamente, o documentário decifra a forma como as crianças se relacionam umas com as outras, com o ambiente em que estão inseridas e também com o tempo.

Para viabilizar as gravações e a finalização, os estudantes estão captando recursos. E abriram uma conta em um site específico para fazer uma espécie de “vaquinha” pela internet. Neste link (http://catarse.me/pt/amarelos), você pode também assistir a um pedacinho do filme e doar dinheiro para a finalização do mesmo. Dá para doar a partir de R$ 10.

O filme tem até página no Facebook: http://www.facebook.com/projetoamarelos. Curta também a página do Facebook do Amorim Lima: http://www.facebook.com/EMEF.Desembargador.Amorim.Lima.

Cena do documentário que está sendo produzido no Amorim Lima com os alunos do primeiro ano matutino
Cena do documentário que está sendo produzido no Amorim Lima com os alunos do primeiro ano matutino

Projeto leva tradição oral e dança a escolas públicas.

Cultura popular é utilizada por educadores no ensino de crianças e jovens

José Maria Mayrink

De Lençóis (BA), onde nasceu como ponto de cultura de educação e tradição oral, a pedagogia do Grão de Luz e Griô espalha-se. Cinco anos após seu reconhecimento pelo Ministério da Cultura, que destina R$ 2,8 milhões por ano à rede para formar educadores, o programa mantém 130 projetos, cada um com quatro mestres e um bolsista.
A figura do griô – um velho que costuma percorrer aldeias para transmitir a tradição de seus ancestrais às novas gerações – nasceu no Mali (África). “São pelo menos 650 bolsistas e mestres que se guiam pelo conceito griô, que não é a gente, mas a comunidade que define”, comemora Márcio Caires, o Velho Griô, que em 1999 começou a percorrer a Bahia com seu violão, cantando e repetindo histórias que aprendeu com moradores da região. Lilian Pacheco, sua mulher, construiu a pedagogia griô para juntar teoria e prática nas escolas, que seria ensinar por meio da tradição oral aliada a dança e música.
Europeus se entusiasmaram com a experiência e financiaram o Grão de Luz e Griô. Um grupo espanhol que trabalha com a tradição galega manda R$ 50 mil por ano e amigos de Genebra, na Suíça, contribuem com R$ 64 mil. Essa parceria já existia em 2003, quando o projeto ganhou o Prêmio Itaú-Unicef?, destinado a entidades dedicadas à pesquisa para melhorar o ensino regular.
Caires segue em Lençóis, mas percorre Estados para animar novos projetos. “Nosso trabalho é no meio rural, mas pode ser transportado para as cidades”, diz. Formado em Administração, abandonou a área para se tornar o cantador de chapéu grande e paletó enfeitado de fitas que encanta as crianças.
Colégios como o Pedro II, no Rio, e escolas como a Desembargador Amorim Lima, em São Paulo, inscreveram pontos de cultura na Rede Ação Griô Nacional, para somar a pedagogia da tradição oral a métodos formais de ensino. A Escola de Comunicações e Artes, da USP, também aderiu ao projeto, por iniciativa do professor Sérgio Bairon Blanco de Sant?Ana, que aplica a pedagogia griô com seis mestres de cultura popular de Jequitibá (MG). Os bolsistas recebem por mês R$ 380 do MinC. A bolsa tem de ser renovada todo ano, mas pode se tornar permanente se for aprovada a Lei Griô Nacional, cuja minuta uma comissão de mestres e aprendizes discute em Salvador.

Fonte:O estado de São Paulo

Reportagem sobre a tradição oral na educação escolar, projeto em andamento no Amorim Lima

Reportagem sobre a tradição oral na educação escolar, projeto em andamento no Amorim Lima. Disponível em http://www.brasildefato.com.br/node/246.

Início

A tradição oral na educação escolar

ter, 2010-09-14 16:10 — Michelle

Ação Griô Nacional busca criar uma política nacional de educação que garanta o ensino das tradições orais e da cultura popular brasileira

14/09/2010

Michelle Amaral
da Reportagem

Poderia ser uma escola pública como outra qualquer. Porém, a Escola Municipal de Ensino Fundamental Desembargador Amorim Lima, que fica no bairro do Butantã, zona oeste de São Paulo (SP), traz algo diferente em sua forma de educar as crianças. Entre as disciplinas do currículo escolar, os alunos têm um tempo reservado para o aprendizado da cultura popular brasileira, através de manifestações da tradição oral.

Este trabalho é realizado pelo Ponto de Cultura Amorim Rima e Centro de Estudos e Aplicação da Capoeira (Ceaca), que atua dentro da escola. Comandado por Alcides Lima, o ponto de cultura atende cerca de 300 crianças de 1ª a 4ª série.

Mestre Alcides, como é conhecido, conta que o trabalho começou por oficinas de capoeira fora do período escolar no ano 2000. E se consolidou quando, em 2005, o grupo passou a ser ponto de cultura, através de um edital do Ministério da Cultura (MinC).

O mestre explica que as aulas sobre a cultura popular ministradas pelo ponto de cultura fogem dos padrões do ensino formal das escolas brasileiras. A oralidade, segundo ele, trata-se de repetição. Assim, nas aulas, as crianças aprendem através da repetição de histórias, cantos, contos, poesias, entre outras manifestações artísticas. Primeiro, aprende-se o que é determinada tradição, trabalhando a parte gestual dela, como dança, música ou teatro. Depois, o aluno estuda sobre a sua origem e todo o contexto que a envolve. “A gente vai dando à criança essa questão da oralidade. Ah, de onde vem o coco? De Pernambuco. E onde fica Pernambuco? Fica no Nordeste. O que é ciranda, cordel? Que linguagem é essa? Como surgiu? Por que surgiu?”, exemplifica Alcides. Desta forma, o ensino da tradição oral complementa a educação formal. Atualmente, o ponto de cultura trabalha além da capoeira, com coco, ciranda, puxada de rede, maculelê e samba de roda.

Ação Griô
O trabalho desenvolvido no Ponto de Cultura Amorim Rima não é único. Ele faz parte da Ação Griô Nacional, uma rede que integra 130 pontos de cultura em todo o país e que, através de seus mestres, busca fortalecer a identidade cultural de crianças e adolescentes, segundo a tradição de cada comunidade.

O objetivo da Ação é criar uma política nacional de educação que garanta o ensino das tradições orais e da cultura popular brasileira. “É uma mudança do currículo, da prática pedagógica da escola com esse novo olhar e com essa nova geração que se cria com os saberes e com os griôs e mestres”, explica Lílian Pacheco, educadora e coordenadora da Ação Griô Nacional.

A rede nasceu a partir do Ponto de Cultura Grãos de Luz e Griô, em Lençóis (BA), do qual Pacheco é coordenadora pedagógica, e hoje é formada por cerca de 750 mestres e griôs aprendizes.

A educadora conta que a Ação Nacional começou quando, com a formação dos pontos de cultura em 2005, o então secretário de Cidadania Cultural do MinC, Célio Turino, se interessou pelo projeto do Grãos de Luz e Griô, que já trabalhava com a oralidade, e decidiu estender a ação para todo o país.

Com isso, os pontos que já realizavam trabalho semelhante passaram a integrar a ação. “Uma coisa que a gente fala, não só eu, mas todos da tradição oral, é que a gente não começou com a Ação Griô, com o Ministério da Cultura. A gente lida com isso há muitos anos”, explica Alcides.

Reconhecimento
Para ser um mestre griô é necessário ser reconhecido por sua comunidade como detentor do conhecimento das tradições orais. Além dos mestres, existem os griôs aprendizes, que são educadores que trabalham com o ensino da cultura popular.

A palavra griô vem de griot, em francês. A palavra tem sua origem em bamanan, língua do noroeste da África, antigo império do Mali, e significa “o sangue que circula”. Assim como o significado da palavra, são reconhecidos como griôs aqueles que fazem com que as tradições circulem entre as novas gerações, preservando a identidade cultural de cada povo.

Lílian Pacheco aponta que a Ação Griô traz o reconhecimento dessas pessoas que guardam os saberes e tradições de cada comunidade. “O mestre griô daquela comunidade passa a ter um outro lugar social, político, econômico e educacional”, relata.

A griô aprendiz Catarina Ribeiro, do Ponto de Cultura A Bruxa Tá Solta, situado em Rorainópolis (RR), diz que nas comunidades em que a Ação Griô atua, percebe-se um olhar atencioso para os mais velhos. “Hoje temos jovens que falam que a melhor coisa no convívio com os mestres é a permanente prática de cooperação e solidariedade”, afirma.

Com isso, os mestres ganham visibilidade e começam a ser reconhecidos em seus locais de origem. “Para nós, do Ponto, eles são os nossos guardiões, fonte em que buscamos a renovação das forças e a alegria para caminhar. E os saberes da tradição oral são o ativo estratégico para continuarmos a riqueza da diversidade cultural brasileira”, conta a griô aprendiz, responsável pela coordenação da Regional Amazônia da rede.

Identidade cultural
Segundo Lílian Pacheco, esse reconhecimento contribui para o resultado que se espera obter através da educação das tradições orais, que é “o fortalecimento da identidade das crianças e dos adolescentes, a ancestralidade da criança e do adolescente de cada comunidade”.

A educadora afirma que, com o trabalho realizado pela Ação Griô, as crianças passam a reconhecer a sua etnia, sua descendência e a história de seu povo. No mesmo sentido, os educadores passam a tratar as ciências que são ensinadas nas escolas com um olhar mais contextualizado dentro do universo dos saberes, enriquecendo o aprendizado. “A ciência que tem o pescador daquela comunidade passa a ser integrada na ciência que está sendo estudada na escola”, exemplifica.

Pacheco, através das experiências vividas em seu ponto de cultura na cidade de Lençóis, reuniu todas as atividades e práticas realizadas e formulou a Pedagogia Griô. No entanto, segundo ela, cada ponto de cultura acaba criando o seu próprio modo de ensino através da oralidade, de acordo com o contexto cultural local.

No caso do Ponto de Cultura Amorim Rima, em São Paulo, Mestre Alcides conta que a capoeira é trabalhada como “uma possibilidade humana de educação”. Ele explica que através dela é possível agregar valores às crianças. “Porque dentro da capoeira tem toda uma questão de resgate de valores, como o respeito, o reconhecimento, entender porque as pessoas não são iguais, que cada um tem a sua dificuldade, que um complementa o outro. A gente trabalha isso”, descreve.

Outro exemplo pode ser dado através da experiência realizada no Ponto de Cultura Nina Griô, que fica em Campinas (SP). Marcos Alberto Simplício, o mestre Marquinhos, relata que um dos trabalhos realizados por seu ponto de cultura é a Roda do Conhecimento, uma reunião mensal de troca de saberes através da oralidade, onde crianças e adolescentes ouvem pessoas envolvidas no universo da cultura popular contarem suas histórias e experiências de vida. Segundo ele, esta é uma “pedagogia que valoriza o poder da palavra e fortalece os processos de formação de identidades locais”.

Para Catarina Ribeiro, “garantir o cuidado e a rede de transmissão oral é garantir a brasilidade que nos diferencia e nos aproxima dos demais povos”.

Fonte:Jornal Brasil de Fato

Reportagem sobre a tradição oral na educação escolar, projeto em andamento no Amorim Lima

ter, 2010-09-14 16:10 — Michelle
Ação Griô Nacional busca criar uma política nacional de educação que garanta o ensino das tradições orais e da cultura popular brasileira

Michelle Amaral
da Reportagem

Poderia ser uma escola pública como outra qualquer. Porém, a Escola Municipal de Ensino Fundamental Desembargador Amorim Lima, que fica no bairro do Butantã, zona oeste de São Paulo (SP), traz algo diferente em sua forma de educar as crianças. Entre as disciplinas do currículo escolar, os alunos têm um tempo reservado para o aprendizado da cultura popular brasileira, através de manifestações da tradição oral.

Este trabalho é realizado pelo Ponto de Cultura Amorim Rima e Centro de Estudos e Aplicação da Capoeira (Ceaca), que atua dentro da escola. Comandado por Alcides Lima, o ponto de cultura atende cerca de 300 crianças de 1ª a 4ª série.

Mestre Alcides, como é conhecido, conta que o trabalho começou por oficinas de capoeira fora do período escolar no ano 2000. E se consolidou quando, em 2005, o grupo passou a ser ponto de cultura, através de um edital do Ministério da Cultura (MinC).

O mestre explica que as aulas sobre a cultura popular ministradas pelo ponto de cultura fogem dos padrões do ensino formal das escolas brasileiras. A oralidade, segundo ele, trata-se de repetição. Assim, nas aulas, as crianças aprendem através da repetição de histórias, cantos, contos, poesias, entre outras manifestações artísticas. Primeiro, aprende-se o que é determinada tradição, trabalhando a parte gestual dela, como dança, música ou teatro. Depois, o aluno estuda sobre a sua origem e todo o contexto que a envolve. “A gente vai dando à criança essa questão da oralidade. Ah, de onde vem o coco? De Pernambuco. E onde fica Pernambuco? Fica no Nordeste. O que é ciranda, cordel? Que linguagem é essa? Como surgiu? Por que surgiu?”, exemplifica Alcides. Desta forma, o ensino da tradição oral complementa a educação formal. Atualmente, o ponto de cultura trabalha além da capoeira, com coco, ciranda, puxada de rede, maculelê e samba de roda.

Ação Griô
O trabalho desenvolvido no Ponto de Cultura Amorim Rima não é único. Ele faz parte da Ação Griô Nacional, uma rede que integra 130 pontos de cultura em todo o país e que, através de seus mestres, busca fortalecer a identidade cultural de crianças e adolescentes, segundo a tradição de cada comunidade.

O objetivo da Ação é criar uma política nacional de educação que garanta o ensino das tradições orais e da cultura popular brasileira. “É uma mudança do currículo, da prática pedagógica da escola com esse novo olhar e com essa nova geração que se cria com os saberes e com os griôs e mestres”, explica Lílian Pacheco, educadora e coordenadora da Ação Griô Nacional.

A rede nasceu a partir do Ponto de Cultura Grãos de Luz e Griô, em Lençóis (BA), do qual Pacheco é coordenadora pedagógica, e hoje é formada por cerca de 750 mestres e griôs aprendizes.

A educadora conta que a Ação Nacional começou quando, com a formação dos pontos de cultura em 2005, o então secretário de Cidadania Cultural do MinC, Célio Turino, se interessou pelo projeto do Grãos de Luz e Griô, que já trabalhava com a oralidade, e decidiu estender a ação para todo o país.

Com isso, os pontos que já realizavam trabalho semelhante passaram a integrar a ação. “Uma coisa que a gente fala, não só eu, mas todos da tradição oral, é que a gente não começou com a Ação Griô, com o Ministério da Cultura. A gente lida com isso há muitos anos”, explica Alcides.

Reconhecimento
Para ser um mestre griô é necessário ser reconhecido por sua comunidade como detentor do conhecimento das tradições orais. Além dos mestres, existem os griôs aprendizes, que são educadores que trabalham com o ensino da cultura popular.

A palavra griô vem de griot, em francês. A palavra tem sua origem em bamanan, língua do noroeste da África, antigo império do Mali, e significa “o sangue que circula”. Assim como o significado da palavra, são reconhecidos como griôs aqueles que fazem com que as tradições circulem entre as novas gerações, preservando a identidade cultural de cada povo.

Lílian Pacheco aponta que a Ação Griô traz o reconhecimento dessas pessoas que guardam os saberes e tradições de cada comunidade. “O mestre griô daquela comunidade passa a ter um outro lugar social, político, econômico e educacional”, relata.

A griô aprendiz Catarina Ribeiro, do Ponto de Cultura A Bruxa Tá Solta, situado em Rorainópolis (RR), diz que nas comunidades em que a Ação Griô atua, percebe-se um olhar atencioso para os mais velhos. “Hoje temos jovens que falam que a melhor coisa no convívio com os mestres é a permanente prática de cooperação e solidariedade”, afirma.

Com isso, os mestres ganham visibilidade e começam a ser reconhecidos em seus locais de origem. “Para nós, do Ponto, eles são os nossos guardiões, fonte em que buscamos a renovação das forças e a alegria para caminhar. E os saberes da tradição oral são o ativo estratégico para continuarmos a riqueza da diversidade cultural brasileira”, conta a griô aprendiz, responsável pela coordenação da Regional Amazônia da rede.

Identidade cultural
Segundo Lílian Pacheco, esse reconhecimento contribui para o resultado que se espera obter através da educação das tradições orais, que é “o fortalecimento da identidade das crianças e dos adolescentes, a ancestralidade da criança e do adolescente de cada comunidade”.

A educadora afirma que, com o trabalho realizado pela Ação Griô, as crianças passam a reconhecer a sua etnia, sua descendência e a história de seu povo. No mesmo sentido, os educadores passam a tratar as ciências que são ensinadas nas escolas com um olhar mais contextualizado dentro do universo dos saberes, enriquecendo o aprendizado. “A ciência que tem o pescador daquela comunidade passa a ser integrada na ciência que está sendo estudada na escola”, exemplifica.

Pacheco, através das experiências vividas em seu ponto de cultura na cidade de Lençóis, reuniu todas as atividades e práticas realizadas e formulou a Pedagogia Griô. No entanto, segundo ela, cada ponto de cultura acaba criando o seu próprio modo de ensino através da oralidade, de acordo com o contexto cultural local.

No caso do Ponto de Cultura Amorim Rima, em São Paulo, Mestre Alcides conta que a capoeira é trabalhada como “uma possibilidade humana de educação”. Ele explica que através dela é possível agregar valores às crianças. “Porque dentro da capoeira tem toda uma questão de resgate de valores, como o respeito, o reconhecimento, entender porque as pessoas não são iguais, que cada um tem a sua dificuldade, que um complementa o outro. A gente trabalha isso”, descreve.

Outro exemplo pode ser dado através da experiência realizada no Ponto de Cultura Nina Griô, que fica em Campinas (SP). Marcos Alberto Simplício, o mestre Marquinhos, relata que um dos trabalhos realizados por seu ponto de cultura é a Roda do Conhecimento, uma reunião mensal de troca de saberes através da oralidade, onde crianças e adolescentes ouvem pessoas envolvidas no universo da cultura popular contarem suas histórias e experiências de vida. Segundo ele, esta é uma “pedagogia que valoriza o poder da palavra e fortalece os processos de formação de identidades locais”.

Para Catarina Ribeiro, “garantir o cuidado e a rede de transmissão oral é garantir a brasilidade que nos diferencia e nos aproxima dos demais povos”.

fonte:Jornal Brasil de Fato

Reportagem sobre gestão democrática nas escolas

No dia 15 de março se comemora o Dia da Escola. Com tantas mudanças culturais, o advento de novas tecnologias e novos paradigmas para o desenvolvimento com autonomia dos estudantes, é preciso discutir qual é o papel que essa instituição hoje realmente desempenha na sociedade. Está claro que, acima de tudo, a instituição não está mais isolada. Cada vez mais, está abrindo suas portas para a participação da comunidade no seu dia-a-dia e em decisões importantes de seu planejamento.

“Tudo isso já está no papel, está na Lei de Diretrizes e Bases, muito bonito, mas realizar é outra história”, afirma Ana Elisa Pereira Flauqer de Siqueira, Diretora da Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMEF) Des. Amorim Lima, no bairro do Butantã, em São Paulo. Ana se refere ao projeto de “gestão democrática” das escolas, previsto por lei, mas que nem por isso é uma realidade na maioria das escolas.

“Pensar na escola democrática é pensar na sociedade democrática e as questões de fundo que se apresentam para os envolvidos nas relações de uma escola é: o que é uma sociedade democrática para mim? Como eu vejo as questões hierárquicas da escola?” questiona a diretora.

Ana admite que, muitas vezes, a raiz da falta de democracia está no autoritarismo dos próprios diretores, mas que apontar essa como causa do problema não ajuda para a solução. “Se o problema fosse só o autoritarismo do diretor, era fácil. As pessoas se movimentariam para tirar esses diretores e pronto. Mas está posto na sociedade a ideia de que o diretor manda, em geral é isso que esperam os pais, os funcionários e os próprios alunos”, afirma. “Isso precisa ser desmanchado para se construir uma nova perspectiva”, diz.

Minoria democrática
A EMEF Amorim Lima faz parte da minoria das escolas que consegue implantar uma prática de participação e integração entre os diversos perfis de atores do sistema escolar. Desde 2003, famílias ligadas aos estudantes mantêm de forma organizada diversas instâncias de discussão, como Conselho Pedagógico, Conselho de Escola e Assembleia Geral para fazer cumprir a carta de princípios aprovada por professores, pais, alunos e diretora para a instituição.

A Carta foi resultado de um longo processo de discussão estimulado pela implantação dos mais diversos projetos culturais por parte das famílias na escola desde a década de 90. “A participação em uma atividade despertava a percepção para problemas relacionados ao cotidiano e sensibilizava as mães e pais a discutir, mais que os problemas, soluções”, conta a diretora.

Hoje, divididos em comissões e grupos de trabalho, familiares de estudantes e ex-estudantes da escola estão presentes no estabelecimento quase todos os dias, conversando com os funcionários para realizar as ações necessárias para garantir a aplicação do plano de trabalho, com filosofia baseada na experiência da Escola da Ponte, de Portugal.

No entanto, ainda que pareça uma experiência harmônica aos olhos de quem sabe do caso pela primeira vez, é preciso lembrar que a aplicação de um plano construído e mantido coletivamente é resultado do esforço diário e do compromisso de todos os envolvidos.

Engajada nessa discussão, a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) defende a “derrubada” dos muros da escola, assumindo uma postura de incentivo aos gestores municipais para que possibilitem o trabalho em rede e a participação das famílias nas escolas. Carlos Eduardo Sanches, presidente da Undime, alerta, no entanto, que é preciso que as escolas se preparem para receber a colaboração da comunidade interessada.

“Como organizar essa participação? É preciso que a escola defina suas próprias expectativas em relação ao papel dos profissionais e em relação ao que espera das famílias. Isso tem que estar alinhado, a acolhida na escola só funciona se tiver um planejamento”, afirma.

Professores
Se os dirigentes querem planejar o que os pais podem fazer e os pais querem apontar o dedo do que esperam dos gestores, o que dizer do professor? Muitas vezes, ele mesmo é o foco de uma atuação nem tão civilizada por parte dos pais. No caso da EMEF Amorim Lima, boa parte das discussões entre os pais foram iniciadas por causa de questionamentos a respeito da dedicação dos professores que, segundo os pais, apresentavam um índice de faltas acima do aceitável.

Os professores, por sua vez, não viam com bons olhos tanta participação das famílias na escola. Além de muitas vezes eles se mostrarem enciumados pelos pais serem os protagonistas de atividades extracurriculares, a ideia de haver controle e exigência de qualidade sobre suas atividades era vista por alguns profissionais como uma ameaça a sua autonomia.

Pelo lado dos dirigentes, Sanches não foge de comentar a velha polêmica entre professores e comunidade: “pai e mãe não vão assumir o papel que é do professor. Não se pode perder de vista que o trabalho desenvolvido na sala de aula é feito pelo professor, mas quando os pais ajudam, isso soma”.

Murilo Rossi, professor da Escola Estadual Guiomar Rocha Rinaldi, em São Paulo, admite que em parte a resistência dos profissionais a se adaptar ao modelo de gestão democrática vem de uma dificuldade de adaptação cultural, porque boa parte de seus colegas é de uma geração que tinha como foco exclusivo o conhecimento acadêmico e não acredita que o professor tem que ter mais responsabilidade do que a transmissão de conteúdo.

Mas ele também não deixa de apontar que a questão salarial dificulta a motivação para que os professores se envolvam em atividades que ultrapassem os horários de aula e as metas acadêmicas. “Se houvesse uma política de gestão que previsse banco de horas ou o pagamento de hora-extra, talvez o profissional conseguisse se dedicar a somente um emprego e se envolvesse integralmente nessas atividades”, aponta o professor, que não se mantém apenas com o salário da Escola.

Foco na sociedade
Rossi acredita, no entanto, que o que falta mesmo é mobilização política: nem mesmo para buscar melhores salários os professores conseguem se articular para fazer uma atuação coletiva, afirma. Nesse ponto, Rossi, Ana e Sanches concordam: o foco da gestão democrática da escola não deve se limitar ao próprio estabelecimento. Trata-se de uma mudança cultural que diz respeito à postura dos cidadãos e, ainda mais, aos problemas da própria sociedade.

“A escola tem que abrir espaço, debater o perfil da região e ofertar participação para as pessoas em suas atividades cotidianas ou mesmo abrir suas portas para outras atividades e experiências que ajudam o desenvolvimento local. Aulas de informática, alfabetização de adultos, abertura de bibliotecas, acesso a internet. Todas essas ações são formas de exercício da cidadania. Todas as ações da escola têm que ser mobilizadas a esse favor”, conclui Sanches.

Para Luis Braga, integrante e colaborador do Conselho de Escola da Amorim Lima, como pai de ex-alunos, a motivação para participar de atividades como essas é justamente esse projeto político: “o que eu buscava [ao começar a participar] era essa utopia, a construção de uma escola pública popular e de qualidade. A escola é a única via para construir a sociedade”.

fonte:Portal Pro-menino

Revista Educação No. 132

REVISTA EDUCAÇÃO – EDIÇÃO 132

Onde as disciplinas se encontram

Muito falado mas pouco executado, o método de ensino interdisciplinar ainda luta para romper a barreira dos preceitos educacionais positivistas; experiências mais radicais estão presentes em algumas escolas brasileiras

Mônica Krausz

Em dois grandes salões da Escola Municipal Desembargador Amorim Lima, no Butantã, zona oeste de São Paulo (SP), crianças da 2ª à 8ª série do ensino fundamental estudam juntas, porém divididas em grupos de cinco da mesma série. Elas seguem roteiros de estudos elaborados com o currículo da escola, a partir de uma perspectiva interdisciplinar, ou seja: apresentam temas que passam por diversas disciplinas ou que utilizam elementos de cada uma delas.
Perto dali, na Escola da Vila, colégio particular construtivista que trabalha com um público de classe média alta, a discussão sobre projetos e questões da interdisciplinaridade chegou a uma metodologia de trabalho que cria uma “disciplina de integração”, ou “Projeto de Integração”, como foi batizado. No município de Cantagalo, no Rio de Janeiro, o Ciep Brizolão 227 João Nicoláo Filho “Janjão” trabalha com projetos interdisciplinares sobre temas transversais, como meio ambiente e racismo, ou atualidades, como eleições e Olimpíadas.
Essas e outras práticas são realmente interdisciplinares? Seus mentores acreditam que sim. Mas o que, efetivamente, caracteriza a interdisciplinaridade? No plano acadêmico, o Brasil assistiu às etapas de conceituação e discussão metodológica a partir da década de 70. Mas, mesmo assim, até hoje muitas das práticas ditas “interdisciplinares” são, do ponto de vista teórico, muito mais próximas do conceito de multidisciplinaridade do que de inter ou transdisciplinaridade. Ou seja, até aproximam disciplinas em torno de um tema, mas não dialogam, não inter-relacionam seus conteúdos e não levam o aluno a estabelecer relações em sua aprendizagem. Ou seja, as discussões acadêmicas em torno da interdisciplinaridade, por mais avançadas que estejam na universidade, ainda estão distantes do cotidiano escolar. Ao menos em igual perspectiva.

Multi, inter e trans

Os conceitos de multi, inter e transdisciplinaridade são distintos e, por vezes, antagônicos em suas propostas e objetivos metodológicos, porém ainda muito confundidos. A multidisciplinaridade pressupõe que várias disciplinas podem ser reunidas; porém, essa reunião não implica nem que elas tenham o mesmo objeto de estudo e tampouco que partilhem qualquer tipo de relação sobre esse objeto. Isto é, na escola os alunos podem estudar a China em geografia, os esportes olímpicos em educação física, o comunismo em história, sem que as disciplinas tenham um planejamento conjunto ou as abordagens metodológicas estipulem conexões entre os temas abordados. Em resumo, a interação entre as disciplinas não é relevante.
“Há apenas a certeza de que existe uma enorme diversidade de temas que uma disciplina sozinha jamais compreenderia”, completa Hugo Monteiro Ferreira, professor de Práticas Pedagógicas da Faculdade de Educação de Vitória de Santo Antão (PE).
No caso do ensino interdisciplinar, dois ou mais campos do saber estão reunidos e voltados para a análise e verificação do mesmo objeto de estudo. Os professores fazem um planejamento conjunto com objetivo de propor discussões que levem os alunos a estabelecer relações entre o que estão pesquisando nas diversas disciplinas em relação a um tema em questão. No trabalho interdisciplinar, uma área enriquece o conhecimento sobre a outra e o resultado é a construção de um saber mais complexo e menos fragmentado, que buscará trazer mais nexos para o estudante, visto que pesquisado e discutido sob diferentes pontos de vista.
Um exemplo disso seria um trabalho conjunto sobre diferentes aspectos da história e da cultura do país que abrigará as Olimpíadas de 2008, envolvendo as disciplinas de educação física, geografia, história e artes, entre outras. A proposta interdisciplinar faria os professores trocarem informações entre e com os alunos, a partir de pesquisas sobre o tema. O princípio metodológico está ligado à idéia de que, nesse processo de mergulho conjunto em um tema, todos participam do aprendizado, ainda que em níveis diferentes, mas havendo um pressuposto de troca.
Já a transdisciplinaridade é um conceito mais amplo. O prefixo trans quer dizer aquilo que está entre, através e além. Nesse sentido, um ensino transdisciplinar não se restringe nem à simples reunião das disciplinas nem à possibilidade de haver diálogo entre duas ou mais disciplinas porque ultrapassa sua dimensão. Faz com que o tema pesquisado passe pelas disciplinas, porém sem ter como objetivo final o conhecimento específico dessa mesma disciplina ou a preocupação de delimitar o que é o seu objeto ou o que é de outra área inter-relacionada. A transdisciplinaridade se preocupa com a interação contínua e ininterrupta de todas as disciplinas num momento e lugar.
Uma notícia sobre as Olimpíadas poderia ser o ponto de partida para uma pesquisa aprofundada sobre os esportes praticados no Brasil, as conquistas olímpicas brasileiras, a história das Olimpíadas, os grandes atletas brasileiros e estrangeiros, os países que já sediaram o evento, a China, a cultura, a história do país que abrigará as próximas Olimpíadas, o custo das passagens para lá China, a economia do país, as diferenças sociais e econômicas entre Brasil e China, enfim, temas que com certeza estão presentes em várias disciplinas, mas que, sob essa óptica, são mais importantes numa abordagem global vistos em fragmentos.
Para o professor Hugo Monteiro Ferreira, cuja tese de doutorado, defendida na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), versa sobre uma experiência transdisciplinar numa escola pública, o conceito do que é multidisciplinar se opõe, em determinado sentido, ao conceito do que é inter e do que é transdisciplinar. A multidisciplinaridade, explica ele, ainda é resultado do paradigma cartesiano-newtoniano, que trabalha com certezas científicas. A inter e a transdisciplinaridade tentam romper com a idéia positivista e trabalhar no campo do pensamento complexo estudado pelo filósofo francês Edgar Morin (1921- ), que reúne, dialoga com, duvida, pesquisa, questiona e constrói conhecimentos que novamente podem ser postos em dúvida porque estão permanentemente em mutação. “Num modelo de ensino inter e transdisciplinar, as disciplinas são postas ao redor de um mesmo objeto e suas situações são cíclicas. Ou seja, as disciplinas não possuem posição de importância uma em relação à outra, porém, em processo de compreensão do objeto, estudam, de um ponto de vista dialógico, aquilo que é objeto do estudo”, explica Ferreira.
O primeiro pensador a definir o ensino transdisciplinar como um grau mais elevado de interdisciplinaridade foi Jean Piaget(1896-1980).

O ensino transdisciplinar, na visão de Jean Piaget, era um grau mais aprofundado do interdisciplinar

Segundo o educador, haveria um momento na história do pensamento humano em que a interdisciplinaridade alcançaria um grau de conexão tão intenso que as disciplinas, para além do diálogo, chegariam a um nível mais elevado de interação. Depois de Piaget, Morin e Cornelius Castoriadis (1922-1997) propuseram, em decorrência de suas reflexões acerca da teoria da complexidade, uma revisão no conceito de ensino que o mundo ocidental adotou a partir das teorias cartesianas e newtonianas sobre a realidade e seus desdobramentos.
Morin rejeita as teorias positivistas que elegeram a razão iluminista como a forma mais legítima de entender e de explicar a realidade. “Ele refuta o discurso redutor das teorias modernas que elegeram a ciência, mais exatamente as ciências naturais, como a única fonte de resposta à questão de o que é a vida”, diz Ferreira.
Para o pensador francês, a transdisciplinaridade propõe que a ciência seja uma forma de explicação da vida, porém não a única nem a mais legítima, visto que a ciência é criação do homem e, por ser criação humana, não pode nem deve estar alheia àquilo que a configura: a sua natureza complexa.

O movimento interdisciplinar

Em Interdisciplinaridade: história, teoria e pesquisa(Papirus Editora), Ivani Fazenda, coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas da Interdisciplinaridade (Gepi) da PUC-SP, relata um pouco da trajetória dos estudos da interdisciplinaridade no Brasil e no mundo. Segundo ela, o movimento da interdisciplinaridade surgiu na Europa, principalmente na França e na Itália, em meados da década de 60, evidenciando o compromisso de alguns professores universitários que buscavam “o rompimento com uma educação por migalhas”, com a organização curricular excessivamente especializada e toda e qualquer proposta de conhecimento que incita o olhar do aluno numa única direção. Um dos principais precursores da interdisciplinaridade foi o filósofo e epistemólogo Georges Gusdorf (1912-2000). Segundo ele, o destino da ciência multipartida seria a falência do conhecimento, pois, na medida em que nos distanciamos de um conhecimento em sua totalidade, estaríamos decretando a falência do humano, “a agonia da nossa civilização”.
As discussões sobre interdisciplinaridade chegaram ao Brasil no final da década de 60. De acordo com Ivani Fazenda, interdisciplinaridade tornou-se, então, palavra de ordem a ser empreendida na educação, uma forma de modismo. A primeira produção significativa sobre o tema no Brasil é de Hilton Japiassu, que publica Interdisciplinaridade e patologia do saber em 1976.
De acordo com Ivani, tanto Japiassu quanto Gusdorf dão indicações detalhadas e ainda atuais sobre os cuidados a serem tomados na constituição de uma equipe interdisciplinar: necessidade do estabelecimento de conceitos-chave para facilitar a comunicação entre os membros da equipe, exigências para delimitação do objeto ou tema a ser pesquisado, repartição de tarefas e partilha de resultados.

Obstáculos e perspectivas

Para Débora Vaz, diretora da Escola Castanheiras, de Santana de Parnaíba (SP), a grande vantagem desta década em relação à de 90 é que agora as escolas estão livres do modismo. “Hoje, olhamos para o conhecimento e vemos que é possível e bom que se favoreça o olhar de um mesmo objeto tendo a contribuição de diversas áreas, mas sabendo e entendendo que não é sempre que isso vai acontecer”, explica.
“Pensamos muito nas escolhas de natureza interdisciplinar, porém temos claro que nem tudo pode ser considerado abordagem interdisciplinar”, acrescenta Débora. No 3º ano do fundamental os alunos estudam quem eram os moradores das serras do entorno de Santana de Parnaíba. “Nesse trabalho, eles lêem gráficos, fazem análises quantitativas do número de indígenas que moravam aqui, mas não o classificamos como interdisciplinar, porque esse trabalho não altera o conhecimento que eles já têm de matemática”, diz. Quando a turma entra no campo das artes para estudar as representações artísticas daquelas nações, isso se altera. “Esse estudo transforma o conhecimento que eles têm de artes e das nações indígenas”, finaliza.
Segundo a diretora, antes de realizar qualquer tipo de planejamento de prática interdisciplinar, os professores tentam responder a uma questão básica: quais são as áreas do conhecimento que contribuirão para o aluno entender melhor esse objeto por diversas ópticas?


Alunos da EMEF Amorin Lima, em São Paulo: experimentação para a busca dos saberes com classes que misturam alunos de idades variadas

Para Débora, as dificuldades no trabalho da interdisciplinaridade ainda estão na formação dos educadores, muito positivista e compartimentadora do conhecimento. “Isso ainda faz com que o próprio professor consiga ver pouco o mesmo objeto de vários lados”, explica. Outro problema, segundo ela, é a falta de investimento na formação de professores em ciências naturais. “O professor tem de buscar conhecimentos desses conteúdos de áreas de pouca cultura no Brasil”, sugere. “Há pouca cultura em física e em química. Fugimos muito dessas áreas: ou sabemos muito pouco, ou generalizamos ou reduzimos”, acredita.
E a terceira dificuldade é a própria forma como o currículo está organizado. “A organização clássica do currículo em x aulas de y disciplinas compromete muito o trabalho com a interdisciplinaridade. O que a gente consegue é, dentro das possibilidades existentes, trabalhar com focos interdisciplinares. Há algumas escolas que rompem com isso num ensino totalmente diferenciado, mas acho que ainda não é a nossa geração que vai viver essa transformação em sua totalidade.”

Ser interdisciplinar

Para a pesquisadora de inter e transdisciplinaridade Cristina Salvador, coordenadora dos cursos de Pedagogia e Formação de Professores da Universidade São Judas Tadeu, em São Paulo (SP), não basta reunir disciplinas em um projeto para ser interdisciplinar. O sucesso da interdisciplinaridade depende de quem trabalha a proposta interdisciplinar. “É preciso ser coerente, humilde e saber se rever. Refletir sobre a sua ação e se renovar. Assim o professor contribui para a construção do próprio conhecimento e do conhecimento do outro.”
As características de um professor interdisciplinar também são descritas por Ivani Fazenda: “O professor interdisciplinar traz em si um gosto especial por conhecer e pesquisar, possui um grau de comprometimento diferenciado para com seus alunos, ousa novas técnicas e procedimentos de ensino. Antes, porém, analisa-os e dosa-os convenientemente”.
Defensora escancarada dessa visão, Ivani acredita que o docente que opta por esse caminho tem maior envolvimento com seu trabalho, mas sofre muitas restrições de ordem institucional. “Seu trabalho acaba por incomodar os que têm a acomodação por propósito”, alerta.

“Se você trabalha na lógica do ‘ou’, você trabalha com exclusão”,diz Cristina Salvador, da Universidade São Judas Tadeu

Os métodos pedagógicos que levam em conta os conhecimentos prévios dos alunos e pressupõem que os alunos constroem seus conhecimentos a partir do que conhecem e da troca com o outro, como o construtivismo, costumam trabalhar bem com a interdisciplinaridade. “É preciso saber de qual conhecimento o aluno já se apropriou para ajudá-lo a superar essa bagagem que ele traz. Dialogar com outras fontes de saber permite reciclar aquilo que você já sabia e se superar”, defende Cristina Salvador, da Universidade São Judas.

Visão abrangente

Uma das vantagens da idéia de interdisciplinaridade é sua opção pela conjunção aditiva “e” – e não pela alternativa “ou”. Por isso, defende Cristina, é inclusiva. “Se você trabalha na lógica do ‘ou’, você trabalha com exclusão. Você tem um bom aluno ou você tem um mau aluno. Você aprende isso ou aquilo. Você exclui. Então trabalhar na lógica do ‘e’ é trabalhar na inclusão. Você tem um aluno que pode ser bom e mau em alguns momentos. Você estuda isso e aquilo, não isso ou aquilo”, completa.
Na opinião da educadora, o mais importante na metodologia interdisciplinar é o olhar. “Na interdisciplinaridade, o educador se permite olhar para outras direções e não fica preso só a um conteúdo específico que pretende ensinar. Vai em busca de outros campos do conhecimento, outras áreas para abastecer o seu próprio campo de conhecimento. Por mais que saiba a respeito de uma coisa, sempre vai ter possibilidade de ampliar o seu campo de conhecimento a respeito dessa mesma coisa.”
Ivani Fazenda resume um pouco da essência da prática do professor que trabalha segundo essa perspectiva: “A metodologia interdisciplinar parte de uma liberdade científica, alicerça-se no diálogo e na colaboração, funda-se no desejo de inovar, de criar, de ir além e exercita-se na arte de pesquisar”.

Para saber mais
– Interdisciplinaridade: história, teoria e pesquisa, de Ivani Arantes Fazenda, Papirus Editora

– Os sete saberes necessários à educação do futuro, de Edgar Morin, Cortez Editora

– Educação e complexidade – Os sete saberes e outros ensaios – Edgar Morin, orgs. Maria Conceição de Almeida e Edgar de Assis Carvalho, Cortez Editora

– Globalização e interdisciplinaridade: o currículo integrado, de Jurjo Torres Santome, Artmed

– O ensino de artes e de inglês, uma experiência interdisciplinar,
de Ana Amália Tavares Bastos Barbosa, Cortez Editora

– Para ensinar e aprender geografia, de Nídia Nacib Pontuschka, Tomoko Lyda Paganelli e Núria Hanglei
Cacete, Cortez Editora

Proximidade máxima

Escolas juntam classes de séries diferentes para trabalhar de forma interdisciplinar

Classes com alunos de várias séries trabalhando em grupos, na EMEF Desembargador Amorim Lima, em São Paulo: trabalho inspirado na Escola da Ponte.

Um modelo de gestão comunitária, inspirado no trabalho da Escola da Ponte, de Portugal. Desde 2004, a EMEF Desembargador Amorim Lima, no Butantã, em São Paulo (SP), vem se reestruturando pedagogicamente de acordo com essa perspectiva.

“Inspirada, porém diferente”, diz a diretora Ana Elisa Siqueira. “Estamos em uma cultura diferente e temos mais do que o dobro de alunos. Mas tínhamos a mesma vontade de mudar o modelo de educação, pois o que havia não atendia ao desejo da comunidade”, explica.
As paredes das salas de aula foram derrubadas. A escola passou a ter dois grandes salões e algumas salas especiais que abrigam biblioteca, informática e a sala da 1ª série, além da sala de oficinas especiais. As turmas de 2ª a 4ª e de 5ª a 8ª séries se dividem em dois grandes salões onde não há mais lousa nem aulas expositivas. Depois da mudança na parte física da escola, iniciou-se um intenso trabalho de reconstrução curricular. “O professor não tem mais uma sala de aula, um grupo de alunos e um quadro-negro. Agora, tem alunos de várias séries, convivendo num mesmo espaço, onde é impossível reger uma aula”, diz. “Então foi preciso ter uma outra perspectiva do trabalho do educador, do trabalho das crianças e da escola como um todo”, conta.
A escola começou, a repensar o currículo. Geraldo Tadeu Souza, doutor em lingüística pela USP, acompanhou durante um ano o trabalho dos professores, observando suas práticas, que naquele primeiro ano foram bastante intuitivas por não haver material didático específico para aquele modelo de escola. “Nesse projeto, os alunos trabalham em grupos de cinco crianças da mesma série, porém no espaço de um salão onde há dezenas de outros grupos da sua e de outras séries, além de professores/tutores polivalentes que acompanham várias crianças de diversos grupos e séries diferentes”, conta Geraldo.
Como a lousa havia deixado de ser o espaço referencial central da sala de aula, os educadores tiveram de propor atividades para atender às demandas dos alunos. Isso significou rever modelos, pois os livros didáticos, por exemplo, pressupõem um trabalho em classe com um único professor ou com professores especialistas divididos por disciplinas.
Depois desse período de observação, Tadeu Souza começou a elaborar roteiros de atividades interdisciplinares que seriam desenvolvidas em cada série. “Com base nos livros didáticos do PNLD escolhidos pela escola, comecei a montar roteiros de atividades”, conta. Hoje, são cerca de 18 roteiros temáticos por série. Cada criança deve cumpri-los em um ano, pois eles contemplam a totalidade do currículo da série.
“Se a criança não conseguir fazer todos os roteiros da 5ª série num ano, ela inicia a 6ª série com os roteiros da 5ª que não conseguiu completar”, conta Ana Elisa. “Lá na 8ª série pode ser que ela tenha vários roteiros atrasados para cumprir, mas nesse caso ela não terá repetido o ano, e sim avançado em seu ritmo”, explica. Hoje esses roteiros estão disponíveis na internet em www.amorimlima.org.br. Toda a comunidade pode consultá-lo e os alunos podem ter conhecimento de tudo o que aprenderão da 1ª à 8ª série do ensino fundamental.
Apenas a 1ª série assiste às aulas em uma sala separada. Isso se justifica, segundo a diretora, pelo fato de os alunos estarem no momento de aquisição da habilidade de ler, fundamental no desenvolvimento dos roteiros temáticos das séries seguintes. Na 2ª série, por exemplo, os roteiros abordam os temas água, ar e fogo, bichos, casa, escola, espaço, família, lazer, terra, medos, percepção, planeta azul, tempo, trabalho, matemática, as quatro operações, dinheiro e números.
No roteiro Escola, a criança trabalhará com português, história, geografia e matemática. Geraldo lembra que, mesmo quando um tema é trabalhado só em uma disciplina, pode usar ferramentas de outras. “Podemos utilizar um tema de história por meio de um texto de literatura infanto-juvenil”, explica. O objetivo dessa abordagem é formar estudantes pesquisadores. Ao final de cada roteiro os alunos preenchem uma ficha de finalização que é a conclusão do trabalho e a ferramenta de avaliação final.

“Trabalhar em grupo não é fazer a mesma coisa ao mesmo tempo. É aprender a trabalhar com, a conviver”, diz Ana Elisa Siqueira, diretora do Amorim Lima

Cada grupo tem cinco estudantes da mesma série, mas cada aluno do grupo trabalha com um roteiro independente dos roteiros dos outros. “Trabalhar em grupo não é todo mundo fazer a mesma coisa ao mesmo tempo. É aprender a trabalhar com, é aprender a conviver”, diz Ana Elisa. A idéia é que os alunos conversem, que se ajudem. O que um está fazendo nesse momento pode ser que o outro já tenha feito ou ainda faça. Os alunos também podem optar por fazer juntos o mesmo roteiro. O pressuposto principal é que todos perfaçam o roteiro em sua integralidade, com diálogo e trocas, sem que haja uma divisão de incumbências, como ocorre normalmente.

Professor polivalente

Outro exemplo de interdisciplinaridade na Rede Municipal de Educação de São Paulo é a EMEF João Pinheiro, na Penha. Lá, os professores polivalentes estão presentes da 1ª a 8ª série. Os professores de 5ª série em diante são especialistas, mas orientam os alunos em todas as disciplinas do currículo, como os polivalentes das séries iniciais. Só artes, inglês e educação física são ministradas por professores especialistas em horários específicos.
De acordo com Marjorie Cortelli, coordenadora pedagógica de 5ª à 8ª série, o trabalho de polivalência iniciou-se na escola há mais de 24 anos com assessoria da Escola Vera Cruz, pioneira no método no Brasil. “Os professores buscaram uma metodologia para combater a retenção, que era muito grande”, lembra. Para isso passaram a estagiar na Vera Cruz.

Marjorie Cortelli, orientadora da EMEF João Pinheiro: material desenvolvido para que o aluno desenvolva os conceitos por meio de pesquisa.

A escola parte da idéia de que o professor trabalha o desenvolvimento de habilidades com os alunos. “Temos um material, composto de fichas de aprendizagem, que é todo diferenciado. Eles não usam o livro didático porque não trabalham dessa forma em que um professor manda abrir o livro e fazer aquilo que está lá. O material é todo formatado para que o aluno vá desenvolvendo os conceitos por meio de pesquisa, com a orientação do professor e apoio dos colegas”, conta Marjorie.
A aula é composta de vários momentos. Num momento principal, chamado de TP (tempo pessoal), sempre que o professor for apresentar um conceito novo, entrega uma ficha com propostas que foram desenvolvidas por professores especialistas para os alunos. Marjorie explica que o TP tem 45 minutos, em que o aluno deve tentar resolver as propostas da ficha entregue. Para isso, ele já sabe que deve consultar as fichas já estudadas, mas que não pode conversar com os colegas. Se tiver dúvidas, se inscreve na lousa para conversar com o professor, que irá orientá-lo e apontar seus erros de percurso. Ao final dos 45 minutos começa o tempo do grupo, em que todos comentam suas descobertas e a forma como chegaram à conclusão de seus trabalhos. Nessa hora, uns contribuem com o aprendizado dos outros, princípio básico das atividades interdisciplinares.

O trabalho com polivalência pode ou não contemplar a interdisciplinaridade, diz Marjorie. Isso dependerá basicamente da atitude do professor. Caso se proponha a orientar os alunos para estabelecer relações entre os conteúdos curriculares, interagir e pesquisar, a polivalência se encaixa na interdisciplinaridade. O processo de planejamento busca explicitar as oportunidades para que isso aconteça. Nas reuniões pedagógicas em que os temas anuais são trabalhados, os professores planejam quais conteúdos darão em cada momento do ano e em que momentos as disciplinas podem ser aproximadas para que uma contribua com as outras.
Segundo a professora Márcia Rodrigues Silva, da 5ª série, o professor polivalente cria um vínculo muito forte com os alunos.

“Conheço todos eles pelo nome, todos me conhecem bem. A interação é muito maior. Em termos pedagógicos, a gente acha que também rende mais por não ter troca de professor, e você pode ter a liberdade de se estender um pouco mais ou um pouco menos num conteúdo sem ficar preso a horários rígidos”, explica. A grande diferença, diz Márcia, é que a polivalência faz o professor estudar e aprender muito mais.

Em São Paulo, recuperação conjunta

Ao mesmo tempo que está implantando um currículo com conteúdo especificado para cada bimestre, série a série, a Secretaria de Estado da Educação paulista iniciou o ano letivo de 2008 aplicando uma recuperação interdisciplinar para os seus 3,6 milhões de alunos de 5ª a 8ª séries e ensino médio.
A recuperação, prevista para acontecer nas primeiras seis semanas de aula, estará focada na revisão e reforço de língua portuguesa e matemática, que serão trabalhadas também nas aulas das outras disciplinas. A medida foi tomada, de acordo com Maria Júlia Filgueira Ferreira, assessora técnica da Secretaria, em função dos baixos índices de desempenho dos alunos em avaliações nacionais e internacionais, e da importância que as duas disciplinas têm para o aprendizado de todas as outras.

Durante esse período de recuperação, professores e alunos utilizam material didático – um jornal para os alunos e uma revista para os professores – criados especificamente para essa atividade.
Maria Júlia acredita que a estrutura do ensino é indutora da fragmentação, pelo fato de ser organizada em disciplinas. Mas a interdisciplinaridade pode acontecer através de uma proposta como essa, em que toda a rede tenta reforçar as competências de leitura e escrita e de raciocínio lógico-matemático por meio das outras disciplinas. Para reforçar as habilidades de leitura e produção de texto foram selecionadas as disciplinas de língua portuguesa, língua estrangeira moderna, artes, educação física, história e filosofia. Já para a competência de matemática foram ligadas as disciplinas de matemática, geografia, biologia, física e química.
Os professores não participaram de um planejamento conjunto, mas o material de apoio foi feito por especialistas com foco na integração entre as disciplinas. De acordo com Maria Júlia, essa é a primeira experiência de interdisciplinaridade planejada e organizada para toda a rede. “Enquanto as outras eram experiências pontuais de algumas escolas, dependendo da criatividade de cada equipe, essa é para toda a rede. Quando você quer resultados em um sistema, tem de intervir no sistema”, diz.
A assessora acredita que se a administração trabalhar um currículo unificado, mas com proposta de pontos de articulação entre as disciplinas, não estará ferindo de morte o conceito de interdisciplinaridade. “É lógico que, se uma escola tem um projeto em que ela desenvolve interdisciplinaridade com sucesso e que atende também às habilidades e às necessidades que estão postas, há um espaço para essa autonomia”, ressalva. “Se a escola souber trabalhar bem com a interdisciplinaridade, vai continuar trabalhando. Mas, caso não tenha essa clareza, se perderá na autonomia. Quem ainda não tem os instrumentos adequados para ser autônomo corre o risco de naufragar”, avalia.
O temor da gestão estadual é que as escolas não consigam direcionar as atividades e, ao final de cada ano letivo, os alunos não tenham aprendido os conteúdos curriculares desejáveis para a série, objetivos essenciais como ensinar a ler, escrever e resolver problemas.

No Rio, orientação comum

Educadora há 25 anos, com experiência em escolas públicas e particulares do Rio de Janeiro, Cássia Ravena, orientadora pedagógica da EM Professor Ewandro do Valle Moreira e do Ciep João Nicoláo Filho “Janjão”, ambas no Cantagalo (RJ), município de 20 mil habitantes, no norte do Estado, vê com otimismo a abordagem da interdisciplinaridade na rede local.

“Felizmente, há um movimento nesse entido. A Secretaria Estadual de Educação enviou orientações curriculares que abordam e aconselham o trabalho terdisciplinar. Foi realizado um curso para coordenadores e orientadores pedagógicos em 2006, e, no início de 2007, as escolas staduais receberam as diretrizes”, relembra.

Hoje, as escolas estaduais trabalham dentro dessa perspectiva na abordagem dos temas ransversais e na pesquisa sobre as questões de atualidades, como eleições e Olimpíadas, por exemplo.

Cássia conta que no ano passado o Ciep “Janjão” trabalhou com o tema do meio ambiente nos ensinos fundamental e médio, tratando de questões como lixo, reciclagem, efeito estufa, entre outros. “Neste ano, pesquisaremos a questão do racismo”, conta. Segundo ela, os alunos estão mais interessados nas aulas e avaliam que fi ca mais fácil entender quando um tema é tratado pelas várias disciplinas de forma conectada. “Eles até participaram de um concurso sobre meio ambiente e venceram”, relata.

A turminha Decide.

A turminha decide

Tempo na balança e no pula-pula bem como os dias de brinquedo são exemplos de decisões tiradas em assembléias por crianças de até quatro anos
Débora Menezes

Na Escola de Educação Infantil Teia Multicultural, na zona Oeste de São Paulo, crianças pequenas no tamanho (elas têm quatro anos), mas grandes na autonomia, já tomam decisões sobre o que querem ou não querem em seu cotidiano escolar. Uma das filosofias da instituição, que pertence à rede particular da capital, é realizar assembléias nas quais os alunos chegam a soluções coletivas para conflitos e expressam os seus desejos.

Representantes da Teia participam da 15ª Conferência de Educação Democrática, em Mogi das Cruzes (SP). O encontro debate princípios de uma educação que abra espaço para que os alunos sejam protagonistas e tenham liberdade de escolha (leia mais). No quinto dia de evento, um dos temas de discussão foi justamente a autonomia na Educação Infantil.

A Teia Multicultural levou alunos ao plenário e transmitiu sua experiência sobre a relação entre professores e a garotada na construção coletiva de regras de boa convivência. Entre os temas debatidos e decididos em assembléias, lembra a diretora e pedagoga Georgya Correa, está o “dia do brinquedo”. A questão para a discussão era: “podemos levar brinquedos diariamente para a escola ou vamos escolher um dia específico para isso”? O consenso foi que um dia seria suficiente. “Tomando decisões por meio de muitas conversas eles vão aprendendo a lidar com as situações do dia-a-dia e passam a entender suas responsabilidades”, diz Georgya.

Outro tema de uma das assembléias na Teia: a balança e o pula-pula são os brinquedos mais concorridos do parque. O que fazer para que todas as crianças brinquem neles na hora do recreio? A solução dos pequenos alunos: estipular um tempo para cada criança brincar, contado pelas batidas do coração.

Para a pesquisadora Marina Letícia Nascimento, especialista em sociologia da infância na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), esses são exemplos positivos de como as crianças constroem sua autonomia. “Elas precisam ter oportunidade de fazer escolhas e nem sempre isso acontece na escola. Nossa tendência é superprotegê-las e decidir por elas”, explica a educadora, que concluiu sua fala lembrando: é negociando que as crianças vão desenvolver suas competências e é fazendo-as construir regras, não apenas impondo-as, que os pequenos terão mais respeito não só aos adultos, mas entre si.

Alunos com poder

De um lado, uma escola onde os alunos têm o poder de selecionar ou até mesmo demitir professores. De outro, uma instituição onde os pais participam do planejamento político pedagógico. As duas experiências, uma nos Estados Unidos e outra em São Paulo, foram apresentadas no debate “Seleção e Avaliação Democráticas de Profissionais da Educação”.
Em Santa Fé, no sul dos Estados Unidos, a Tutorial School tem um sistema diferenciado de outros estabelecimentos de ensino. Não há um currículo formal a ser seguido; são desenvolvidos programas de pesquisa seguidos pelos aluno, cada qual no seu ritmo. No dia-a-dia, todos são apoiados (e não cobrados) pelos professores. Os estudantes também realizam assembléias para decidir sobre as regras da escola e têm o seu próprio comitê para selecionar professores e até mesmo sugerir demissões. No final de cada ano, os educadores também são avaliados pelos alunos.

A idéia é que esses princípios garantam um ambiente não-autoritário, sem clima de medo, onde os alunos têm mais condições de se envolver com os estudos e conviver em harmonia.
Se você acha que essa liberdade é desfrutada de forma enviesada pelos alunos, veja o comentário do professor Moe Zimmerberg: “Uma das coisas mais difíceis é aprender a decidir. Mas ter essa responsabilidade é a melhor forma de desenvolver o auto-conhecimento desses estudantes”. Os pais têm papel importante nesse processo, segundo a filosofia da escola: “os jovens aprendem a ter responsabilidade somente quando seus pais adotam uma política de não-interferência. Pais precisam aprender a confiar quando seus filhos tomam suas próprias decisões, mesmo se os próprios pais não concordam com elas”.

Autonomia na gestão

Na Escola Municipal de Ensino Fundamental Amorim Lima, na zona Oeste de São Paulo, a busca pela autonomia alcança não só os alunos, mas também os pais. Após anos de evasão e indisciplina, a escola, com 800 estudantes, transformou seu ambiente em salas de aula sem paredes, implantou um currículo sem exames finais e um conselho escolar atuante, espaço para o conhecimento e o debate do plano político pedagógico pelos pais.

Tão forte é o conselho, que a escola se uniu a outras Emefs – Presidente Campos Salles, Gabriel Prestes e Olavo Pezzotti – para propor à Secretaria Municipal de Educação a criação de uma rede de autonomia em São Paulo. A proposta está sendo discutida e melhorada e prevê que as unidades participantes tenham conselhos igualmente fortes, dando espaço para que a comunidade participe das decisões. Outra reivindicação é que as escolas tenham autonomia até mesmo para fazer a própria gestão financeira e selecionar novos educadores para a equipe. “Não queremos grandes revoluções, apenas mais liberdade de atuação”, afirma Luis Braga, presidente do conselho da Amorim Lima.

Agência FAPESP

Como melhorar a educação

Por Fábio de Castro

Agência FAPESP – Um dossiê sobre a qualidade do ensino básico no Brasil é o destaque da 60ª edição da revista Estudos Avançados, lançada na última segunda-feira (10/9). Além de reportagens sobre a situação atual dos professores do ensino público na cidade de São Paulo, a revista apresenta reflexões sobre políticas de educação e experiências de gestores em busca da melhoria do ensino.

De acordo com Marco Antonio Coelho, editor-executivo da publicação do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da Universidade de São Paulo (USP), o dossiê foi resultado de um trabalho conjunto com a Faculdade de Educação (FE) da USP.

“A situação do ensino básico no Brasil é um tema que tem interessado o IEA profundamente desde sua fundação e foi abordado em vários números da revista. Para focalizar o problema específico da qualidade de ensino, contamos com a contribuição dos pesquisadores da FE, que têm feito discussões importantes sobre esse aspecto”, disse Coelho à Agência FAPESP.

Segundo Coelho, há um consenso em relação à insuficiência do ensino fundamental no Brasil. A revista optou por reunir experiências que indicassem caminhos bem-sucedidos para o desafio da qualidade.

“Procuramos unir a reflexão teórica à descrição de casos de sucesso. Apresentamos, em reportagens, casos que mostram como é possível dar um salto de qualidade. Ao lado disso, fomos buscar o testemunho de educadores e gestores que estiveram envolvidos com experiências positivas”, explicou.

A reportagem Professores, elo frágil da educação faz um diagnóstico da situação atual dos professores do ensino básico público paulistano. Segundo Coelho, a matéria também aborda com detalhes uma das experiências mais reveladoras apresentadas no dossiê.

“É um projeto impressionante desenvolvido pela Escola Amorim Lima, no bairro do Butantã, em São Paulo. A proposta foi implementada a partir de 1996 pela professora Ana Elisa Siqueira e trouxe transformações significativas no funcionamento da escola, na participação da comunidade e no envolvimento dos alunos”, disse.

Participação e responsabilidade

De acordo com Ana Elisa, o projeto se caracteriza pelo trabalho em conjunto, com intensa participação de estudantes, professores, funcionários e comunidade. “Nossa meta é uma escola em que exista participação e responsabilidade de todos”, disse no evento de lançamento da revista na sede do IEA.

Coletivamente, os educadores construíram um currículo que torna possível o trabalho com roteiros que perpassam todas as áreas do conhecimento, com foco na pesquisa. “O projeto se concentra numa abordagem integral do conhecimento universal, fazendo sempre interface com a cultura”, disse Ana Elisa.

A inspiração do projeto, de acordo com a professora, é a conhecida experiência da Escola da Ponte, em Portugal. “É um projeto muito generoso no sentido em que permite que suas matrizes sejam adaptadas e aplicadas em outros lugares. Temos a mesma perspectiva de construção coletiva e distribuição das responsabilidades”, afirmou.

A revista, que tem como editor o crítico e historiador de literatura Alfredo Bosi, conta também com uma série de artigos. Três ex-secretários de Educação relatam experiências em busca da melhoria do ensino básico realizadas nos últimos anos em Porto Alegre, Belo Horizonte e Ceará.

Glaura Vasques de Miranda descreve o projeto da Escola Plural, adotado na capital mineira a partir de 1994. José Clovis de Azevedo analisa a questão da qualidade do ensino a partir de sua experiência na secretaria de Porto Alegre e Sofia Lerche Vieira, ex-secretária de Educação Básica do Ceará, trata da gestão escolar, avaliação e sucesso escolar, a partir das experiências realizadas naquele estado de 1995 a 2006.

Em outro artigo, Sandra Zákia Souza, professora da Faculdade de Educação da USP, discute as políticas de implantação da organização das atividades escolares em ciclos e as implicações decorrentes disso, como no caso dos processos de avaliação dos alunos. Ladislau Dowbor, da PUC-SP, debate a importância da vinculação do aprendizado à realidade do local onde a criança vive.

A necessidade do aperfeiçoamento do ensino de ciências nas séries iniciais é a questão abordada por Ernst Hamburger, professor titular aposentado do Instituto de Física da USP e coordenador do programa ABC na Educação Científica, da Academia Brasileira de Ciências.

A edição contém ainda outras quatro seções dedicadas a outros temas. Alimentação e educação, reúne sete artigos sobre o tema. Na seção Bertolt Brecht, os professores Celso Frederico e Mark Clark debatem textos e biografia do autor alemão.

A seção Textos traz artigos sobre Graciliano Ramos, Fernando Sabino, Otto Lara Resende, Hélio Pellegrino, Paulo Mendes Campos, Luiz Gama e Hanna Arendt. A edição é completada por sete resenhas de lançamentos recentes no mercado editorial brasileiro.

Revista Estudos Avançados Nº 60
Editor: Alfredo Bosi
Preço: R$ 30
Mais informações: http://www.iea.usp.br
Locais de venda: http://www.iea.usp.br/iea/revista/onde.html

Jornal da Tarde – diretor de escola é esquecido pelos pais

 

Diretor de escola é esquecido pelos pais

MARIA REHDER, maria.rehder@grupoestado.com.br

Delegar para outros a responsabilidade sobre a qualidade da educação pública é característica predominante na sociedade brasileira. De acordo com a Pesquisa Ibope-Educação?, encomendada pelo movimento ‘Todos pela Educação’, 29% dos brasileiros acreditam que o Ministério da Educação (MEC) é o órgão que mais está ajudando na melhoria da educação. Enquanto isso, pouco mais de 10% da população crê que os pais de alunos e os diretores de escolas estão de fato fazendo a diferença.

Depois do MEC, aparecem o governo federal e os professores da rede pública, respectivamente. ‘Está em vigor um modelo delegativo. Em vez de participar da escola, entender o papel dos diretores e secretarias municipais e estaduais de educação, os brasileiros preferem atribuir a responsabilidade da educação para o governo e ao professor, que atua diretamente com os alunos’, afirma Fernando Abrúcio, especialista em Educação da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Não só a participação ativa da sociedade, mas a boa gestão escolar ajuda na melhoria da educação pública. É o que ressalta Luís Norberto Pascoal, presidente da DPaschoal. ‘Uma boa gestão é aquela realizada por projetos e para a definição e execução de cada um desses projetos a escola precisa contar com a contribuição da comunidade, dos pais, alunos e demais profissionais da escola.’

O executivo – que é membro do movimento ‘Todos pela Educação’ – concorda que a escola bem gerida tem impacto direto no desempenho dos alunos. Destaca, porém, que não há um modelo de gestão ideal predefinido. ‘É preciso criar espaços para a troca de experiências, de forma que os diretores tenham acesso às práticas de gestão que deram certo em outras escolas e possam adequá-las à sua realidade específica.’

Na prática

Waldir Romero, diretor da Emef Comandante Garcia D’Ávila, Zona Norte – escola cujos alunos fazem questão de ressaltar que ‘era maloquinha e hoje ficou arrumadinha’ – concorda com Pascoal. ‘A gestão aberta à comunidade e a liberdade dos funcionários fizeram com que a evasão escolar e a violência fossem reduzidas. Tal abertura leva tempo, mas dá resultados.’

Waldir assumiu a direção da escola em 1996, por meio de parceria com a Escola de Samba Unidos do Peruche, freqüentada pela comunidade local, para conseguir aproximar os familiares dos alunos da escola. ‘Os pais precisam participar do cotidiano da escola. Enquanto eles ainda delegarem a responsabilidade da educação apenas aos professores, ficará difícil ter uma educação de qualidade.’

Conselho de Escola

Já Gilberto Fracheta, membro do Conselho de Escola da Emef Desembargador Amorim Lima, Butantã, acredita que a população vê o MEC e o professor como os atores que mais ajudam na melhoria da educação, pois os professores são os grandes responsáveis por boas aulas e o MEC é que garante a liberdade no currículo escolar.

No entanto, Fracheta, que é pai de ex-aluno da Emef Amorim Lima, destaca que, quando atuam em parceria nos Conselhos de Escola, diretores e pais de alunos fazem grande diferença. ‘Essa afirmação não vale só para a Amorim, mas para todas as escolas que têm bons gestores, pois quando o diretor é democrático e incentiva a participação dos pais, esses atores se tornam fundamentais para a educação de qualidade’, afirma.

Especialista português defende inovar sem copiar.

metódo – 23 /10/2006

Especialista português defende inovar sem copiar

Educador virou referência no país após inovações da Escola da Ponte

José Pacheco diz que escolas brasileiras que se inspiraram no modelo criado por ele já começam a apresentar bons resultados

Algumas das inovações de escolas brasileiras têm como inspiração uma pequena escola no norte de Portugal, que ganhou fama no Brasil depois que o educador Rubem Alves lançou o livro “A Escola com que Sempre Sonhei sem Imaginar que Pudesse Existir”.

Por causa do crescente interesse de pedagogos brasileiros pela experiência, o mentor da Escola da Ponte, José Pacheco, 54, passou a dedicar boa parte do seu tempo a palestras e a cursos no Brasil e virou consultor da rede Pueri Domus Escolas Associadas.

Periodicamente, visita a Emef (Escola Municipal de Ensino Fundamental) Amorim Lima, na zona oeste de São Paulo (leia texto na página ao lado), que mudou a metodologia de ensino após contato com a experiência portuguesa.

O que chamou a atenção de vários educadores para a Escola da Ponte de Portugal, com 30 anos de existência, é o fato de ela não se adequar aos padrões tradicionais.
Não há divisão por séries e as aulas não são separadas por disciplinas. São os alunos que, com a ajuda do professor, selecionam seus projetos de estudo. São eles também a indicar para o professor quando se sentem preparados para serem avaliados, e não o contrário.

Pacheco diz que há várias experiências brasileiras que estão tendo sucesso ao seguir os mesmos passos, mas afirma que não é o momento de dar visibilidade a elas. Veja trechos de sua entrevista à Folha:

FOLHA – O trabalho de sua escola em Portugal virou referência no Brasil. Mesmo assim, o senhor não acha que há poucas escolas daqui que ousam mudar?
JOSÉ PACHECO – Já não são poucas as escolas brasileiras que ousaram inspirar-se na prática da Escola da Ponte. Mas continuarão invisíveis até o momento em que adquiram sustentabilidade e possam ser reveladas. As mudanças em educação são sempre lentas. A visibilidade social precoce mata os projetos inovadores. Venho acompanhando processos de mudança bem pensados, planejados, refletidos e avaliados, sem nada de improviso. Só coloco uma condição às escolas que acompanho: que a Escola da Ponte seja inspiração, mas que não seja objeto de imitações. A Ponte não pode correr o risco de se converter em mais uma moda pedagógica, ou num mito inútil.

FOLHA – Como preparar alunos de escolas com projetos pedagógicos diferentes para se acostumarem com os modelos tradicionais?
PACHECO – Na Ponte, os alunos aprendem a fazer prova, embora não contem para avaliação, pois terão de fazer provas no futuro em muitas situações e lugares. Formamos nossos alunos para a autogestão do tempo e para se adaptarem ao ritmo do toque de uma campainha. Eles aprendem a estar em qualquer contexto. Sabem ser solidários, mas não deixam de ser competitivos.

FOLHA – A Escola da Ponte foi bem em avaliações nacionais?
PACHECO – Sim. Ela foi avaliada por testes, iguais para todas as escolas, e ficou classificada entre as melhores. Foi a única escola portuguesa avaliada por uma comissão nomeada pelo Ministério da Educação. Os relatórios revelaram a excelência do projeto. A partir dos dados, o ministério reconheceu a Ponte como referência.

Projeto em escola pública demonstra que ensinar pode ser diferente.

Setor 3 – 11 de agosto de 2006

Projeto em escola pública demonstra que ensinar pode ser diferente

Juliana Rocha Barroso e Roberta Santana

Os muros que dividiam o espaço em salas foram derrubados. Crianças de sete a 14 anos, juntas nestes grandes salões e espalhadas por todos os outros cantos, auxiliam umas às outras no desafio de atingirem objetivos que elas mesmas escolheram. Um mundo de descobertas que elas têm que desvendar. E gostam assim. Sem sinal. Aulas expositivas, só quando realmente necessário. Esta é a descrição de uma escola. E o mais incrível: brasileira e pública. Ela nasceu há dois anos, apesar de completar seu qüinqüênio este ano. "É como quando a gente aprende um jogo novo. Com o tempo, a gente pega o jeito", explica o aluno da 5ª série, Natan, que, como muitos outros passou pela transição. Acompanhado da tutora, Terezinha Maria da Silva, Natan, Nicolas e Sabrina, os três com 11 anos, nos conduziram a este universo, em que todos são aprendizes e nos contaram o que tem de diferente na sua escola.

Tudo começou há oito anos quando o conselho de escola, sempre atuante da EMEF Desembargador Amorim Lima - zona Oeste de São Paulo -, questionou problemas que considerava sérios e que refletiam diretamente no desempenho dos alunos. As mudanças foram sendo construídas na perspectiva da participação, a comunidade foi se interando da escola e dando conta do que queria como educação, o que achava importante para seus filhos. Um dos problemas era o recreio. Apenas quatro funcionários, em um percurso das 8h às 23h, acumulavam funções como fazer a merenda, limpar a escola e acompanhar o recreio. As crianças se machucavam, tinha muita briga. A proposta foi que as mães ajudassem neste horário. "Na medida em que as mães começam a olhar a escola, começam a ver um monte de coisas, que levaram para o conselho de escola de outro jeito. Foi um momento muito difícil dentro da escola, porque a comunidade via questões que a escola de fato não dava conta e ela queria resultados imediatos", conta Ana Elisa Siqueira, diretora do Amorim há quase dez anos.

Outro problema: a freqüente falta de professores. Algumas crianças entravam às 8h e saiam ao 12h, sem ter tido aula nenhuma. Quando o problema ia para o Conselho, a escola falava da indisciplina dos alunos, e os pais traziam as faltas dos professores. "Como que a gente resolve esta confusão? Os professores que vinham pegavam meninos que durante o dia tiveram muito de tempo livre. Isso cria uma indisciplina muito grande", conta. Este círculo vicioso levou ao questionamento dos pais em relação ao projeto político pedagógico da escola. "Eles perguntavam: quem tem desrespeito com quem? A indisciplina é de quem?", relembra Ana. Ela conta que um grupo menor com representatividade de todos os segmentos começou a estudar os problemas. A primeira coisa que fizeram foi mapear as ausências dos professores. Com isso, descobriu-se uma grande quantidade de faltas, não de todos os professores, mas de alguns de áreas do conhecimento fundamentais, por exemplo, Língua Portuguesa.

Existia uma descontinuidade de trabalho. Os pais queriam entender como era regida a coisa pública. Depois, pediram que a diretora trabalhasse um pouco as questões legais. O direito, o dever do professor. Estudaram a Lei 8989, que rege o funcionalismo público, trabalharam o regimento das escolas municipais e também fizeram um trabalho em cima do estatuto do magistério. "A partir deste estudo, os pais começaram a não mais olhar o projeto político pedagógico apenas em relação ao que eu dizia. Eles queriam que eu apontasse como a gente ia fazer de fato tudo que estava naquele documento", conta Ana. Ela lembra ainda que a grande discussão no momento era que determinados alunos atrapalhavam a sala de aula e por isso tinham que sair da escola. "Cheguei ao ponto de dizer que negociaria tudo o que eles quisessem, menos tirar aluno."

O que fazer com todo este cenário? Segundo Ana, na época, a perspectiva era de tentar construir um projeto coletivo. Com a verba do Fundo Nacional de Desenvolvimento Educacional (FNDE), a escola decidiu aplicar na formação da equipe escolar. Durante dois anos (1998 e 1999), trabalhou com o Instituto Pichon Rivière, que tem como proposta a formação contínua de profissionais interessados em propiciar um diálogo criativo, crítico e democrático, gerador de mudanças nas pessoas e nos grupos. Mas o que é grupo, como se forma? "Às vezes os mais bonzinhos também acobertam o problema da sala. É uma dinâmica que se estabelece no grupo que permite que determinadas coisas aconteçam e outras não. O trabalho com o Instituto começou desde o agente escolar – a pessoa que limpa a escola – até o diretor", ressalta.

Depois do Pichon, a escola trabalhou com o Vereda, que segue a proposta do educador Paulo Freire, também contratado a partir da pequena verba. "Fazíamos umas entradas com grupos de educadores, depois com educadores, alunos e pais, às vezes só educadores e pais", explica. Já com a Práxis, assessoria educacional, o grupo do Amorim assistiu a um vídeo da Escola da Ponte, experiência educacional portuguesa de 30 anos. "Ficamos encantados com a apresentação do aluno e de como ele era dono do processo da sua aprendizagem. Como dizia que conseguia aprender, e sabia o que ele sabia e o que ele não sabia e o que precisava aprender para mudar de objetivo", diz Ana. Ela lembra que o conselho de escola ficou entusiasmado com a possibilidade de construir um projeto que tivesse essa perspectiva. "Conseguimos escrever um projeto, só que tinha um custo da assessoria. Todos nós bancamos e esses pais levaram o projeto para a secretária de educação da época, Maria Aparecida Perez." Quando visitou a Amorim, a secretária escutou, entendeu e aceitou fazer um projeto piloto na escola. "A gente não sabia muito bem como ia fazer, o que a gente sabia é que tinha como inspiração a Escola da Ponte. Estudamos o trabalho e fomos pensando como a partir dele", conta Ana, que já visitou a escola portuguesa. A única certeza, segundo a diretora, é que precisavam de professores polivalentes.

Roteiros de Vida

O projeto não começou na escola inteira. A assessoria queria começar só com a 1ª série do Ensino Fundamental, mas levariam oito anos para ter o projeto na escola toda. Os pais não aceitaram essa proposta. "Desde o primeiro ano, eu já analisava isso. Você não pode conviver muito tempo com duas escolas", justifica Ana, que acredita ter sido muito sábia a atitude dos pais. "Começamos com os primeiros e quintos anos porque quando as crianças entram na escola a maior parte não está alfabetizada. Foi importante ter estas duas pontas. Quando terminou 2004, já tínhamos mapeado a escola como um todo". Neste primeiro ano não houve tempo para mexer no currículo e foram respeitadas as possibilidades dos professores. Foi incorporado também o trabalho de cultura brasileira que já acontecia extra-aula. "Mas percebíamos que tudo que os professores preparavam era muito pouco para os alunos. Eles podiam muito mais".

Foi um professor, doutor em Lingüística, da Universidade de São Paulo estagiário na Amorim durante um ano, que observando o trabalho da escola, descobriu uma forma de viabilizar o conhecimento das crianças de forma melhor, usando como base todos os livros didáticos sem que houvesse a necessidade de um professor regendo as aulas. Geraldo Tadeu Silva criou os roteiros de pesquisa, usados hoje como base para o ensino da escola e que passam por todas as áreas do conhecimento. As crianças trabalham o tempo todo em grupos de cinco, em que cada aluno desenvolve o objetivo da área do conhecimento que vai trabalhar e tem as atividades de cada objetivo. A maior parte do tempo os alunos trabalham nesta dinâmica. Cada ano tem uma quantidade de roteiros. "Cada criança aqui tem o seu próprio ritmo, sua própria perspectiva de aprendizagem. O que é bacana é que tem um currículo que está posto hoje. A criança busca pelo roteiro onde estão as fontes das informações que vão satisfazer este objetivo. É maravilhoso", ressalta Ana.

A equipe escolar teve que ser otimizada para dar conta da nova dinâmica. Têm educadores que acompanham o trabalho de salão, têm os oficineiros e os tutores, responsáveis por acompanhar um grupo de 15 a 18 alunos durante a semana. Todos os educadores da escola são também tutores, inclusive a diretora. O compromisso da escola é com o conhecimento. Eles observam como estes alunos se organizaram no salão dentro do roteiro, como cada um colocou seus objetivos e os realizou, o que falta e o que não falta fazer e por que. Cabe ao tutor um trabalho pontual e importante. "Tem uma imagem para mim que é muito bonita: quando se tem uma planta pequena e se quer que ela cresça, você coloca um pauzinho do lado dela e amarra. Este pauzinho tem o nome de tutor", compara Ana.

A escola teve muitos casos de rejeição. E ainda hoje muitos alunos saem, mas muitos outros entram por causa do projeto. Para que ele se viabilize e sobreviva, a diretoria não acabou de uma hora para a outra com os antigos valores. No ano passado, foram implementadas oficinas de leitura e escrita e de matemática, por serem uma exigência muito grande da comunidade. "Não posso destruir, tenho que construir a partir de. O que é mais bacana deste projeto é que ele está sendo construído pelas pessoas que estão aqui e a comunidade vai dando um feedback", conta.

A coordenadora de educação do Butantã e Pinheiros, Sônia Regina Lima, destaca a experiência da Amorim como uma prática altamente solidária. "Já não é mais a minha sala, o meu aluno. Uma relação de compartilhar, de companheirismo, de solidariedade que vai além, porque implica no estabelecimento de outros vínculos, além dos tradicionais", justifica. Sônia também destaca o estímulo à descoberta. "Essa questão do desafio é um estímulo para a busca a que nós deveríamos ter sidos submetidos. Com certeza teríamos aprendido muito mais ao longo da nossa vida escolar". Ana concorda e destaca ainda o fato de os educadores da escola serem tão aprendizes quanto os alunos. "Fazemos o roteiro junto com as crianças e, como elas, acabamos sendo pesquisadores. O educador tem que ser alguém que pesquisa o tempo todo. Esse é o roteiro, é a abertura da possibilidade." Ana cita um exemplo de como as coisas funcionam. No semestre passado, foi trabalhado pela tutoria um roteiro chamado "pesquisador". As crianças aprenderam como pesquisar, como procurar em uma enciclopédia. Depois disso, o tutor permitiu que cada tutorando seu escolhesse um tema de pesquisa, um foco que interessava a criança. "O que nós estamos tentando fazer é buscar em cada estudante desta escola a possibilidade de aprender, que ele se encante com esta possibilidade, que veja que pode aprender e não aprende apenas o que o outro manda", justifica a diretora.

Ana Elisa rejeita a idéia de que a Amorim esteja tentando reproduzir o modelo da Escola da Ponte. "Estamos nos valendo desta maravilhosa experiência. Ela parte de pressupostos bastante generalizáveis que a gente pode se apoiar para pensar a nossa realidade, as nossas características e a nossa história. Temos um apoio, a partir dele a gente pode pensar o que tem e como usar isso." Um desafio porque coloca em cheque valores estabelecidos. Mas, segundo Ana, a Amorim Lima tem o que todas as demais escolas públicas municipais têm. Apenas seu projeto a diferencia. "Isso é uma coisa importantíssima para a gente avaliar o que acontece nas escolas", conclui. Para o jovem Natan e seus amigos este "apenas" faz toda a diferença.

•Revista Escola – Qual o segredo do sucesso de um gestor?

Em qualquer empresa, são os resultados. Em educação, é o aprendizado de qualidade para todos os alunos. Veja o que algumas diretoras fizeram para chegar lá

Quando se trata de administrar uma instituição, a tarefa mais importante do gestor ou da equipe gestora é tomar as decisões certas para chegar a resultados positivos, ou seja, ao lucro. Em educação, essa frase poderia ser traduzida assim: implantar as mudanças necessárias na escola para que todos os alunos aprendam. Manter a papelada em dia, atualizar os relatórios e outras questões burocráticas fazem parte da rotina de qualquer administrador, mas tudo isso deve ser feito em função do objetivo principal da escola.

A Pesquisa Nacional Qualidade da Educação, realizada no ano passado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), do Ministério da Educação, mostrou que os pais acreditam que os diretores exercem papel importante em relação à qualidade da educação e também na comunidade. A opinião dos entrevistados, ainda que intuitiva, reforça o que os especialistas em gestão defendem há muito tempo.

A ex-secretária da Educação do estado de São Paulo, Rose Neubauer, atualmente diretora do Instituto Protagonistés, na capital paulista, lembra que nos anos 1990 ela e sua equipe acompanharam o rendimento escolar dos alunos de 60 unidades da rede paulista, localizadas em regiões ricas e pobres, urbanas e rurais. Foram descobertas várias “escolas zebras”: algumas que tinham todas as condições favoráveis para oferecer um ensino de qualidade nem sempre apresentavam bom desempenho e vice-e-versa. “O que faz a diferença é a gestão”, afirma Rose.

Atenção ao nível de aprendizagem da turma

Mas o que é uma gestão escolar eficiente? De acordo com José Ernesto Bologna, diretor do Instituto Ethos de Desenvolvimento Humano e Organizacional, em São Paulo, a resposta está na preocupação do gestor com o pedagógico: “É função do diretor ou da equipe gestora estar sempre alerta aos problemas de aprendizado para ajudar o professor a encontrar as melhores estratégias de ensino”. Além de incentivar o uso de novas metodologias e tecnologias, o diretor deve promover a discussão permanente de assuntos pedagógicos e outros que permeiam a educação, como o comportamento afetivo e sexual dos jovens, as drogas e o consumismo.

“O diretor que realmente deseja mudar faz a hora, não espera que as coisas aconteçam”, argumenta Rose Neubauer, parodiando uma canção de Geraldo Vandré. Ela afirma que a escola geralmente é uma instituição que reage negativamente a mudanças, e todos os rituais de passagem são enfrentados com resistência. Opor-se a essa inércia é uma das marcas do bom gestor.

Todos envolvidos na solução dos problemas

A boa gestão não está ligada às ações de uma só pessoa, mas envolve a comunidade pedagógica todos que interagem com os alunos e que ensinam algo a eles. Apesar de o papel do diretor ser fundamental, sozinho ele não consegue atingir as metas de um aprendizado de qualidade. O coordenador pedagógico é seu braço direito para procurar alternativas para a sala de aula, ir atrás de estratégias de ensino novas e eficientes, planejar os horários de trabalho coletivo ou coordenar discussões pedagógicas. O professor, por sua vez, também deve estar envolvido com o trabalho de gestão, pois na ponta de todo o processo está ele com sua classe, aplicando tudo o que foi discutido em equipe.

Luzia Tavares, diretora do Colégio Estadual Júlia Kubitscheck, no Rio de Janeiro, envolveu os professores e os alunos em questões ligadas à aprendizagem. “Era necessário melhorar a leitura e a escrita e os conhecimentos em Matemática de uma boa parte dos estudantes. Ao mesmo tempo precisávamos motivar os que já tinham adquirido essas habilidades”, afirma. A saída foi elaborar, coletivamente, um projeto de monitoria. No contraturno, os jovens com melhor rendimento ensinam os colegas que apresentam alguma dificuldade. “As médias de notas subiram e os alunos começaram a se sentir co-responsáveis pelo aprendizado da turma”, conta Luzia.

A comunidade também foi envolvida quando a Escola Municipal de Ensino Fundamental Desembargador Amorim Lima, em São Paulo, inovou a maneira de ensinar. Direção e corpo docente resolveram testar um novo modo de organizar as turmas, o que significaria romper com o sistema de séries e até, literalmente, derrubar algumas paredes. A diretora Ana Elisa Siqueira conta que a idéia era implantar um método de ensino baseado na experiência da Escola da Ponte, de Portugal, em que alunos de várias idades e séries têm aulas todos juntos, com o professor atuando como um facilitador do aprendizado em grupos menores de trabalho. O Escola Sem Paredes, como foi batizado, passou pela análise de alunos e pais, que responderam a uma pesquisa sobre a viabilidade e a aceitação do projeto. A novidade foi introduzida primeiramente com as turmas de 5ª e 6ª séries, mas, como os resultados foram positivos, o projeto será expandido a toda a escola.

Eduardo Monteiro

Prédio bem-cuidado e professores capacitados

Segundo Regina Giffoni Brito, coordenadora do curso de pedagogia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, passar de uma cultura ineficiente para uma que traga resultados positivos envolve mudança de hábitos, valores e até de arquitetura. Maria Helena Campomizzio Astolphi, diretora da Escola Municipal de Ensino Fundamental Professora Lucinda Araújo Pereira Giampietro, em Birigüi, interior de São Paulo, começou as mudanças pelo visual do prédio. Ao assumir o cargo, há cinco anos, ela detectou problemas de acolhimento dos alunos e tratou de melhorar a estrutura física. “A reforma do prédio e a nova pintura acabaram com as pichações e as depredações. Os alunos se sentiram mais acolhidos e muitos afirmam que se sentem em casa quando estão na escola”, afirma a diretora.

O desempenho da turma nas atividades de leitura e de escrita era outra questão que Maria Helena precisava atacar. A solução, nesse caso, foi a capacitação, inclusive da diretora, que procurou se aperfeiçoar em sua função. Durante os anos de 2003 e 2004, Maria Helena fez o curso Gestão para o Sucesso Escolar, oferecido pela Fundação Lemann e pelo Instituto Protagonistés, em São Paulo, para diretores e coordenadores pedagógicos. As aulas ajudaram a diretora a refletir sobre sua atuação perante a escola e a traçar planos de ação. “O curso foi fundamental para eu mudar minha visão sobre a função que passei a exercer”, conta Maria Helena.

Disposta a se envolver mais nas ações para melhorar o aprendizado da leitura e da escrita, ela incentivou todos os professores a participar de palestras e oficinas em jornada promovida pela secretaria municipal. Animada com as novas possibilidades de ensino, a equipe sugeriu diversas ações, imediatamente encampadas pela direção: uma pesquisa para detectar as preferências de gêneros de leitura dos alunos; o convite a grupos de contadores de histórias para apresentações periódicas; a publicação do jornal Olho Vivo, com a participação de todas as turmas; e a rádio da escola, que entrou no ar em setembro com um programa musical veiculado na hora do recreio com entrevistas, histórias da música brasileira, recados e propagandas tudo produzido pelas turmas de 1ª a 8ª série.

Outra sacada da equipe foi envolver os pais nos projetos de leitura. Três vezes por semana, um deles vai até a escola ler para as turmas. Depois de ouvir os contos, os alunos debatem a história que acabaram de escutar”, conta Maria Helena.

A diretora faz parte da primeira turma de gestores formados em 2004 pela Fundação Lemann e pelo Instituto Protagonistés. O grupo era composto de 200 diretores de escolas dos estados de São Paulo e Santa Catarina. Os alunos das 4as e das 8as séries de todas elas foram avaliados antes do início do curso e alguns meses após o encerramento. A média geral dos estudantes das 4as foi de 24,2 para 28,55 de um total de 40 pontos. Já nas 8as, as notas evoluíram em média 9%, indo de 26,5 para 29,96. Além disso, em ambas as séries houve redução no porcentual de alunos situados nas faixas das notas mais baixas.

Características do bom gestor

Para José Ernesto Bologna, o diretor da escola é como um maestro: “Ele rege a orquestra, mas suas mãos são ampliadas pelo grupo de especialistas que o rodeia”. Um bom gestor deve ser um líder e agregar as seguintes atitudes:

Estar sempre preocupado com os resultados da aprendizagem.

  • Participar do planejamento e fazer o acompanhamento do trabalho docente.

 

  • Conversar com alunos e funcionários para detectar problemas e níveis de satisfação e ouvir sugestões.

 

  • Ser um construtor de consensos, mas estar sempre aberto às novas idéias e à diversidade, aceitando opiniões e novas propostas.

 

  • Ser audacioso o suficiente para fazer as mudanças necessárias visando sempre melhorar a qualidade do ensino.

 

  • Manter as questões administrativas em dia.

Folha de São Paulo – Eu acredito na escola pública

OCTÁVIO MOTTA FERRAZ
Da equipe de trainees

Dona Luisa Nakabashi e seus 4 filhos, Careen, 27, Myna, 29, Nicols, 25, e Cassius, 15 (da esq. da dir.), na escola estadual Érico de Abreu Sodré, na Vila Mariana, onde todos estudaram
No Brasil de hoje, quem tem condições financeiras não deve pensar duas vezes antes de colocar seus filhos numa escola particular, certo? Errado. Pelo menos é essa a opinião do corretor de seguros Luiz Braga, da funcionária aposentada do Banespa Luisa Nakabashi e da jornalista Ivanir Lopes. Eles têm em comum a convicção de que a escola pública ainda é a melhor opção para seus filhos.

Braga, Nakabashi e Lopes fazem parte de uma minoria no país. Segundo pesquisa do Inep de maio deste ano, apenas 7,5% dos alunos da escola pública são de famílias das classes A e B. A grande maioria dos alunos vem de famílias das classes D e E (58,1%) e C (29,7%).

Para Luiz Braga, a idéia generalizada de que as escolas particulares são muito melhores que as públicas “é um engodo”. No ano que vem ele colocará seu filho de seis anos na escola pública municipal Desembargador Amorim Lima, do bairro do Butantã (zona oeste de São Paulo).

“Não conheço nenhuma escola particular que tenha um projeto pedagógico tão diferenciado como a Amorim Lima”, afirma. Dá como exemplo a questão da cidadania. “Nas escolas particulares, o assunto costuma fazer parte do currículo, como outra matéria qualquer.” Na Amorim Lima, diz, “a cidadania faz parte do próprio projeto pedagógico”.

Outro ponto importante para ele é a diversidade social dos alunos. “Na escola pública meu filho vai estudar com gente de todas as classes, desde o filho das pessoas pobres que moram na favela São Remo (próxima à escola), até filhos de professores da USP e profissionais liberais como eu”, diz.

Esse ponto também é ressaltado pelo psicanalista Contardo Calligaris, cujos três filhos estudaram em escola pública no exterior. Para ele, “a escola privada, mesmo que seja excelente, tem um déficit social, ou seja, ela não proporciona a experiência que a escola pública proporcionaria, de conviver durante os anos de escolaridade com diversos níveis sociais”.

Luisa Nakabashi tem idéias parecidas. Todos os seus quatro filhos estudaram em escola pública. Os três mais velhos, Myna, Careen e Nicols, que já terminaram o ensino médio, freqüentaram as escolas estaduais Érico de Abreu Sodré e Brasílio Machado, ambas na Vila Mariana (zona sul de São Paulo). O filho mais novo, Cassius, 15, está na sétima série da escola estadual de ensino médio Rui Bloen, em Mirandópolis (também na zona sul).

Nakabashi decidiu que os filhos iriam estudar em escola pública para “se deparar com a realidade; para conviver com crianças que nem condições de comprar uniforme tinham”.

Assim como Braga, ela acha que há uma supervalorização da escola particular, ressaltando que seus três filhos mais velhos estão na universidade. Myna, 28, faz doutorado em biologia na USP.

Para a jornalista Ivanir Lopes, que tem um filho na sétima série da Escola de Aplicação da Faculdade de Educação da USP, a principal razão para manter seu filho lá é o projeto pedagógico diferenciado. “A educação na Escola de Aplicação tem um componente lúdico que não se encontra em outras escolas, nem mesmo nas particulares”, afirma.

Todas essas escolas, porém, são destaques dentro de um sistema público com muitas falhas. Se tivesse que optar entre a escola particular e uma escola pública padrão, Calligaris admite que provavelmente escolheria a primeira. Lopes pensa da mesma maneira e colocará seu outro filho, que não conseguiu vaga na Escola de Aplicação, em escola particular.

Escola municipal promove inclusão com projeto pedagógico diferenciado.

Rede SACI
22/11/2004

A diretora da Escola Municipal Desembargador Amorim Lima, Ana Elisa Siqueira, fala sobre os progressos obtidos com a metodologia de trabalho

Ana Beatriz Iumatti

A Amorim Lima é uma escola pública diferente. Há oito anos, sua diretora transformou o modus operandi da escola e propôs uma nova forma de organização. O currículo da escola está voltado para a cultura brasileira e para os esportes. Na escola há uma pista de skate, horta e mosaicos espalhados por suas paredes dando uma impressão de vida a seus visitantes. Conheça mais sobre a Amorim no texto abaixo
A questão da inclusão
“Estamos fazendo um trabalho de fortalecimento da comunidade, o que foi fundamental na história do Amorim. Eu estou há oito anos aqui no Amorim Lima e temos construído um trabalho de participação. Na quantidade e na qualidade da participação dos pais, que é muito grande. Eles participam muito e de verdade. Têm um posicionamento muito claro do que eles querem da escola, como eles querem a escola e é isso que, nesses oito anos, tem ajudado muito o trabalho.
Porque na perspectiva da inclusão, os pais se mostram muito solidários à ação do diretor, pelo menos na minha experiência. E a inclusão não é feita somente com os alunos que têm os problemas ditos mais graves. Você precisa incluir a criança que não gosta de estudar, aquela que não é olhada pela família, que tem dificuldade, até as crianças que não se aceitam como pessoas, pois nós temos isso também.
O que eu percebo é que os pais têm bastante sensibilidade em relação a essas questões. Primeiro, porque se sentem na pele dos outros pais, pois sabem que a qualquer momento um desses problemas pode vir a acontecer com eles. Então, os pais são muito parceiros nessa perspectiva. Quando eu cheguei havia essa prática de que ‘a gente pode tirar’ o aluno que dá muito trabalho, ele pode ser transferido. Eu nunca tentei isso, de falar com o diretor de outra escola e sugerir uma troca de problema: ele me manda um aluno ‘problema’ e eu mando outro. Eu prefiro os meus problemas, os problemas que vêm para mim, do que os problemas dos outros. Porque os problemas que chegam aqui, nós tentamos conhecer e cuidar. Muitas vezes, não conseguimos e aí escapa das nossas mãos.
Mas, muitas vezes conseguimos. Então, quando havia uma pressão dos professores para que algum aluno saísse, a questão era levada ao Conselho de Escola (formado por representantes de todos os funcionários, pais e alunos) e os pais me apoiavam muito.
Os pais do Conselho do Amorim são muito diversificados, a nossa clientela é muito diversificada. Temos pais com nível universitário, que fazem doutorado, mestrado, e pais analfabetos, que tiveram o mínimo de escolaridade. Mas, de qualquer forma, a escola tem uma comunidade que é muito diversificada e isso é muito interessante.
Isso cria um diálogo e uma rede de solidariedade. Teve uma família em que o pai e mãe vieram para São Paulo fazer doutorado na USP e havia uma pessoa que trabalhava na casa deles fazendo trabalho doméstico. Os filhos dela e desse casal, todos estudavam aqui. Então, essa convivência é um aprendizado maravilhoso. No Conselho, não há essa diferença de ‘classe social’. Já faz uns quatro anos que a gente também tem um pai que usa cadeira de rodas. E isso muda em muita coisa, ele é o presidente do Conselho Municipal da Pessoa Deficiente, o Gilberto Frachetta. Ele é muito rígido nessas questões, o que é fantástico. Existe um protetor dessa questão dentro da escola.
Este ano, estamos com uma criança que veio do ‘Lugar de Vida’ (Pré escola terapêutica do Instituto de Psicologia da USP), com um laudo de autismo. A menina está bastante comprometida, ela tem dez anos e é a primeira vez que vem à escola. A idéia do ‘Lugar de Vida’ é que essa menina fosse para uma EMEI (Escola Municipal de Educação Infantil). O pai saiu à procura de escolas e veio aqui, quando resolveu que queria esta escola.
Mas o Amorim não tem educação infantil. Aí o NAE (Núcleo de Ação Educativa) achou melhor que ela entrasse no ensino fundamental mesmo, porque já tinha dez anos e seria bom ter contato com crianças mais velhas. A Amanda, então, acabou vindo para o Amorim e no começo sua chegada foi bastante conturbada porque ela é uma criança que depende muito ainda de uma outra pessoa que esteja junto.
Quando eu a conheci, achei que realmente o melhor para ela teria sido uma EMEI, mas agora ela está superadaptada. Vem três vezes por semana, mas já vai começar a vir os cinco dias. Nós conseguimos, para os dias em que a Amanda vem, uma estagiária da USP de psicologia para acompanhá-la. Não só a ela, mas a classe toda. Se a Amanda estiver bem, ela ajuda em outras coisas.
Existe uma dificuldade dela se organizar dentro da escola, as professoras têm medo que ela saia e vá embora, ela não fala, ainda não consegue sustentar o olhar. Mas ela já apresenta grandes progressos, é impressionante. Não apenas por parte dela, mas por parte da mãe, da família.
Essa mãe mudou completamente. Assim que chegou o material da Prefeitura, ela foi a primeira a trazer o material, tudo com nome, lápis apontado e ela ainda não consegue nem pegar num lápis. Então, por conta do projeto que a gente tem hoje, a Amanda é uma questão de toda a escola. Quando ela chegou, cada um reagia diferente com ela, por exemplo, uma inspetora de alunos rolava na grama com ela, cada um ficava junto de um jeito. Isso foi muito bacana porque nós começamos a ver que a escola podia assumir a questão.
A escola tem que ter uma maneira de incluir bastante boa tanto para a pessoa, como para as pessoas que já estão no processo escolar. Isso não pode ser de qualquer jeito, tem que haver o cuidado. Nunca recebemos crianças com outros tipos de deficiência, visual, auditiva; o nosso caso mais grave é a Amanda. Ela ainda não está em processo de alfabetização, não é essa nossa perspectiva por enquanto.
Projeto pedagógico
Estamos trabalhando com o primeiro e o quinto ano do ensino fundamental dentro desse projeto. A perspectiva dele é a de que os alunos comecem a construir uma autonomia de aprendizagem.
Então, por exemplo, os 105 alunos do primeiro ano ficam juntos numa sala só, mas não juntos o tempo todo. A mesma coisa acontece no quinto ano. O projeto começou este ano e a idéia foi iniciá-lo com as duas pontas de ciclo, antes de expandir para a escola inteira.
Antes, havia três salas de quinto ano que nós juntamos em uma só. A gente tem, no primeiro ano, por exemplo, 21 grupos de cinco alunos. E estão ‘nomeados’ com letras, até a vigésima primeira. Só que elas nunca ficam juntas o tempo todo.
As atividades são as seguintes: jogos cooperativos, informática, circo, capoeira, sala de leitura, educação ambiental, música e a sala de aula que é a sala de atividade. No primeiro ano, é basicamente o trabalho de leitura, escrita e matemática. No quinto ano, é o trabalho de português, matemática, geografia, história e ciências. As outras atividades para os maiores são inglês, artes e teatro. Essas atividades extras estão sendo trabalhadas como oficinas.
Durante a semana, todas passam por todas as atividades. O grupo A, por exemplo, vai sempre junto em todas as atividades que são da rotina. Em cada atividade, sempre estão cinco grupos ou 25 alunos, sempre grupos diferentes da atividade anterior. Assim, os 21 grupos se encontram sempre nas atividades. E o melhor é que, para 25 alunos, há três professores na sala de aula, o que permite que cada um dispense uma atenção maravilhosa para cada grupo.O professor consegue trabalhar pessoalmente com as questões de cada um.
A escolha dos grupos foi feita aleatoriamente, no começo. No decorrer do ano, houve algumas modificações. No primeiro ano, na perspectiva da alfabetização, houve um esforço para que os grupos se organizassem de forma que os alunos que têm mais facilidade ajudarem os outros. No quinto ano, houve casos de pessoas que são muito amigas, mas ‘não funcionam’ na hora de trabalhar juntas.
As mudanças ocorreram, mas antes há diversas conversas com o grupo, com o aluno que vai ser mudado. Então, a perspectiva é a de que o aluno trabalhe o tempo todo em grupo, mas a aprendizagem dele é pessoal, porque cada um aprende ou entende de um jeito diferente.
A idéia da classe homogênea (heterogênea) vem desse princípio. No quinto ano, como os alunos já são alfabetizados, a construção da autonomia é mais rápida e mais fácil. Os professores organizam um currículo em termos de objetivos, os alunos escolhem esses objetivos e trabalham em cima deles.
O professor traça os objetivos a partir do currículo, que é um recorte do conhecimento que as pessoas fazem, já que hoje em dia não existe mais currículo oficial. Nos atuais parâmetros curriculares cabe tudo e mais um pouco. Então, como é muito difícil você definir um currículo ou um projeto de acordo com os professores que estão na escola, já que muitos não ficam aqui ou não trabalham com certo livro, por exemplo, é a comunidade que deve ser a mola propulsora de um projeto que de fato permaneça”.

Folha de São Paulo – Quem quer ficar com São Paulo

GILBERTO DIMENSTEIN

Numa das mais ousadas experiências desenvolvidas atualmente em uma escola pública no Brasil, pais de alunos estimularam a derrubada das paredes das salas de aula. Surgiram, no lugar delas, amplos espaços multidisciplinares. Os alunos se dividem em pequenos grupos, cuja tarefa é, essencialmente, pesquisar e produzir conhecimento, orientados pelos professores das mais diferentes matérias compartilhando o mesmo espaço.
Os grupos circulam por vários ambientes e mesclam aulas de capoeira, teatro, ecologia e jogos com o currículo tradicional de português, estudos sociais, ciências e matemática. O aprendizado não é medido por testes burocráticos, mas pelo desenvolvimento de habilidades e pela capacidade de associação de idéias.
Apesar de contar com o estímulo oficial, não há ali nenhum recurso público extra. Atingiu-se tal ponto de sofisticação devido à ação das famílias e da comunidade em articulação com os educadores. Neste fim de semana, por exemplo, pais, alunos e professores decidiram reunir-se, em torno de uma macarronada, para produzir painéis e embelezar essa escola municipal (Amorin Lima), no Butantã, bairro de classe média da cidade de São Paulo.
Esse laboratório comunitário dá uma extraordinária lição – e talvez a menos importante seja a de pedagogia- aos candidatos à prefeitura paulistana.

O debate sobre a eleição paulistana transmite a impressão de que a cidade está em segundo lugar. A preocupação das elites políticas está centrada no impacto da eleição no cenário federal e estadual.
Nos bastidores, especula-se se o vencedor usaria o cargo apenas como um trampolim para projetos maiores, de curto prazo. Marta Suplicy talvez, quem sabe, viesse a disputar o governo estadual; ganhando nas urnas, José Serra analisaria a possibilidade de dar mais um salto antes mesmo de acabar seu mandato. Paulo Maluf precisaria de palanque para se defender das denúncias cada vez mais avassaladoras da existência de contas bancárias em seu nome no exterior.

Marta e Serra me disseram que pretendem cumprir, se eleitos, o mandato. A ver. É certo, porém, que encaram, em algum grau, a prefeitura como uma passagem, o que, diga-se, é legítimo e compreensível -enfim, faz parte da vida política. Mas vão ter de provar que, se eleitos, vão mergulhar na efervescência de São Paulo, cenário de uma ofensiva comunitária jamais vista na cidade, na qual aquela escola transformada em laboratório é um dos muitos sinais -é uma reação à violência, à pobreza, à degradação urbana, movida pela constatação de que o poder público não irá muito longe sem parcerias.
Disseminam-se associações para cuidar não apenas de bairros mas especificamente de ruas, praças e parques. E até mesmo de árvores e de monumentos. Arquitetos ajudam a embelezar favelas como a Heliópolis. Cansados da feiúra, comerciantes tiram dinheiro do próprio bolso para melhorar as calçadas em frente às suas lojas e bancam intervenções paisagísticas. Construtoras fazem melhorias nas comunidades em torno de seus empreendimentos para não ter obras embargadas, ganhar simpatia ou ter seus imóveis valorizados.

Um dos mais interessantes sinais da reviravolta urbana ocorre na recuperação do centro da cidade, que está visivelmente melhor. Tudo começou com a reação da comunidade e agora se multiplicam ações que (coisa rara no Brasil) agregam vários departamentos dos governos municipal, estadual e federal, além da iniciativa privada.
Alguns dos programas de complementação de renda são resultado de uma engenhosa teia formada por verbas de todos os níveis de governo.
Museus, teatros, cinemas, orquestras, livrarias e espaços culturais desenvolvem programas de inclusão educacional, seja atraindo alunos de escolas públicas, seja formando professores. Pela periferia, multiplicam-se cursinhos pré-vestibulares gratuitos e uma infinidade de projetos de protagonismo juvenil, muitos dos quais na arte, como os voltados para o grafite e para o hip hop.

Como é o centro brasileiro do chamado terceiro setor -não há na cidade uma só grande empresa que não patrocine um projeto comunitário-, São Paulo só poderia ser naturalmente a grande escola de experiências comunitárias do país. É o berço da responsabilidade social das empresas. A Bolsa de Valores de São Paulo, por exemplo, inventou um pregão apenas para investidores drenarem recursos a projetos sociais. Preparam-se, no setor financeiro, linhas de empréstimo a empresas socialmente conscientes.
É profundo o esforço de reciclar mão-de-obra daqui para se adaptar à vocação de serviços, em que moda, culinária, marketing, propaganda, medicina e finanças, entre outros setores, geram excelência e cosmopolitismo.
De acordo com o que acompanho de outras cidades pelo mundo, como Bogotá, Cidade do México, Nova York, Chicago, Boston e Barcelona, é possível dizer que São Paulo é um gerador de experiências, o que a torna referência como laboratório social. Quem não percebe isso simplesmente não conhece a cidade.

A combinação fértil (embora dolorosa) de riqueza humana -afinal, somos o pólo mais importante do capital humano brasileiro- com degradação urbana fez de São Paulo não apenas um desafio mas uma monumental aventura contemporânea.
O fato novo é o nascimento de um sentido de coletividade, de pertencimento. Esse movimento será reforçado se o prefeito não encarar a prefeitura como um meio, mas como um fim; que não queira só “ficar” com a cidade, mas se casar com ela ou, pelo menos, namorá-la profundamente.

PS – Pode-se discutir a eficiência ou validade do CEU como escola, mas não como um centro comunitário em bairros sem equipamentos culturais. Seria péssimo se, numa eventual derrota de Marta, aquele projeto, a exemplo do que ocorreu com escolas desse tipo, entrasse em crise. É o risco que correm planos feitos para servir de marca de um governo e/ou de um governante -mas, nesse caso, isso precisa ser evitado.

Revolução no Ensino

O Estado de São Paulo, 13 de maio de 2004

Revolução no ensino

Numa escola municipal crianças estudam em grupos de 5, ouvem música clássica e decidem quando serão avaliadas
RENATA CAFARDO

As paredes foram derrubadas e surgiu um amplo e claro salão que uniu as três turmas de 5.ª série. A mudança física simboliza bem a reviravolta vivida pela escola municipal Amorim Lima. Com os tijolos, foram embora provas, aulas expositivas, o foco na figura do professor. As crianças agora estudam em grupos de cinco, ouvem música clássica na aula e escolhem quais atividades farão na semana. A avaliação? Só quando elas se dizem prontas.
A inspiração veio da Escola da Ponte, instituição portuguesa de 28 anos que recentemente começou a conquistar admiradores por aqui. A idéia é a de que cada criança tem seu ritmo diferente de aprendizagem. Lá, os objetivos, tarefas e deveres dos alunos são decididos por eles mesmos numa assembléia, não há salas de aula, nem séries. Quem vê de fora, a chama de escola democrática, apesar de seu fundador, José Pacheco, preferir o termo cidadã.
“O professor não passa a ser dispensável, ele ganha outras atribuições.
Ajuda a criança a definir objetivos, procura bibliografia para orientá-la, não dá a resposta”, diz Pacheco. Na Amorim Lima – que fica no Butantã e é primeira escola pública a adotar o método -, as professoras estão aprendendo a se tornar polivalentes. São 3 à disposição de 105 alunos num mesmo salão, realizando atividades de diferentes disciplinas. Nenhuma delas está na frente da classe, falando alto, ditando a lição. Passam pelos grupos, tirando dúvidas. “A gente consegue acompanhar o raciocínio da criança enquanto explicamos”, diz a professora Geise Grangeiro Costa.
Pela escola, vê-se grupos de estudantes fora das salas. Uns em aulas de educação ambiental, outros, de teatro. “A gente tem de pegar os livros sozinho, aprender a ser responsável”, diz Cynthia Lima, de 11 anos, enquanto estuda pinturas rupestres. Em uma ficha, ela anota em quanto tempo consegue aprender cada tópico. Quando Cyntia se considerar pronta, a professora fará a avaliação individual. “Tem muito barulho na classe”, reclama sua colega Pamela Pires. Do alto-falante sai uma música suave. “É para ajudar na nossa concentração”, explica Jorge Figueiredo, de 10. “Prefiro rock”, emenda André de Almeida. E volta para o exercício de matemática.
O projeto começou este ano só com as 1.ª e 5.ª séries. Os alunos ainda se acostumam com a novidade, mas a mudança foi proposta pelos próprios pais – orientados pela psicóloga Rosely Sayão. A diretora Ana Elisa Siqueira visitou a Escola da Ponte e é uma das grandes defensoras do modelo. “Não há mais aula vaga. Se falta um professor, o aluno continua a atividade porque tem autonomia”, diz Regina Chaves, mãe de dois alunos.
A secretária municipal de Educação, Cida Perez, também aprova o projeto. O que mais agrada aos educadores é o fato de a proposta lembrar o sistema de ciclos, no acompanhamento individual do aluno e nas avaliações contínuas.
Até então apenas a escola particular Lumiar, na capital, tinha o mesmo perfil. Outras, como as que fazem parte da Pueri Domus Escolas Associadas, tentam introduzir algumas inovações no modelo convencional. A proposta, no entanto, surgiu nos anos 20, com a escola inglesa Summerhill. Depois de mais de 70 anos, ela foi fechada e especula-se que um dos motivos foi a expulsão dos professores pelos próprios alunos.

Folha de São Paulo – O prazer de derrubar grades

 

GILBERTO DIMENSTEIN

Educada por freiras do colégio Sion, em São Paulo, filha de pais que lhe impunham severas condições para freqüentar festas, Ana Elisa Siqueira sempre foi bem-comportada. Até passar a dirigir uma escola pública: começou a arrancar grades, a derrubar paredes das salas, a subverter a rotina de professores e a se misturar a alunos que não gostavam de estudar. A transgressão fez com que a escola da qual é diretora fosse apresentada no Fórum Mundial da Educação, no domingo passado, como um laboratório pedagógico.
Há sete anos, Ana Elisa assumiu a direção da Escola Municipal Desembargador Amorin Lima, numa rua sem saída do Butantã. A diferença se vê logo na entrada do prédio: um acolhedor jardim e paredes decoradas com painéis de mosaico feitos pelos alunos. “Ninguém aprende num lugar triste e desinteressante.” Seu primeiro gesto foi arrancar as grades de ferro. “Os alunos se sentiam presos.” Para levar seu projeto adiante, Ana Elisa teve uma vantagem: como a escola fica no Butantã, muitos de seus estudantes são filhos de professores da USP. A comissão de pais tornou-se uma peça fundamental na gestão e estimulou o gosto da diretora pela experimentação.
Depois, era derrubar as grades curriculares. Desde 2003, assessorada pela psicóloga Rosely Sayão -especialista em novas relações de aprendizagem professor/aluno-, introduziu aulas de capoeira, dança, educação ambiental e teatro conectadas às aulas de ciências, história, geografia e língua portuguesa. Sugeriu, então, que os alunos formassem grupos de cinco e circulassem em vários espaços, sempre pesquisando juntos. “O papel do professor é ensinar a pesquisar.” Fez que os professores derrubassem as suas próprias grades.
Para ter essa circulação, ela resolveu literalmente pôr abaixo as paredes. No lugar das apertadas salas com cadeiras enfileiradas diante da lousa, surgiram salões imensos, onde dezenas de grupos trabalham ao mesmo tempo sobre diferentes assuntos, orientados por diferentes professores.
Sem saber, porém, Ana Elisa estava criando uma bomba. Os alunos submetidos ao novo sistema exibem melhor aproveitamento, mais curiosidade e mais responsabilidade. Suas salas são mais conservadas, o corredor é mais limpo. Os demais, confinados às salas antigas, com matérias e professores tradicionais, estão revoltados a tal ponto que há diferentes horários de recreio. “Espero que no próximo ano todos estejam no mesmo sistema.” Seu projeto é aproveitar as férias de fim de ano para derrubar mais paredes. “Quanto menos grades, mais prazer na escola.”

Escola desenvolve projeto modelo de resgate cultural

Na Escola Municipal Desembargador Amorim Lima, em São Paulo, pais e professores se uniram com a proposta de cuidar da infância e preservar a cultura do País.
Com uma dose de boa vontade e seguindo a fórmula que soma carinho, organização, presença e participação da comunidade, a arte e a educação puderam caminhar juntas e fizeram da Escola Municipal Desembargador Amorim Lima, no bairro do Butantã, na zona oeste de São Paulo, um exemplo a ser seguido.
Tudo começou quando a Associação de Pais e Mestres da escola resolveu atuar de maneira mais ativa na vida escolar. Em um primeiro momento, as mães receberam a incumbência de inventar atividades para a hora do recreio. “Elas resgataram brincadeiras simples e populares que já fizeram parte da infância e hoje em dia ficaram de lado, como roda, pular corda, amarelinha”, lembra a diretora Ana Siqueira. A bagunça do recreio cresceu, integrou crianças e mães e ganhou o status de Oficina de Brincadeiras. “As crianças, hoje, vivem isoladas em casa, a rua é uma ameaça e todo o lado lúdico que o ato de brincar na rua oferecia se perdeu. A idéia é a de que a escola seja um espaço para brincadeiras, um local onde a criança exercite o direito de ser criança”, explica Conceição Acioli, coordenadora do projeto. Conceição é uma das mães da escola, com formação em teatro de bonecos e uma das mentoras de série de atividades que ocorrem no
colégio.
A proposta da direção da escola sempre foi clara: preservar a infância e a cultura do País. De que maneira? Mantendo viva a tradição. As festas juninas do Amorim contam com quadrilha e música caipira de raiz. “Aqui não tem Tchan ou popozudas, tomamos cuidado na escolha das músicas, daquilo que transmitimos aos alunos”, diz a diretora. “Outro aspecto importante é fazer com que as mães participem do desenvolvimento de seus filhos, que a mãe assuma o papel de mãe e também o de educadora”, observa Conceição. O segundo passo foi a criação da Cia. das Mães para teatro de bonecos. Elas foram as responsáveis pela confecção dos bonecos e roteiro das histórias apresentadas aos alunos na sala de leitura. Os
textos debatem temas como cooperação entre as pessoas, integração, respeito às diferenças e tópicos presentes no Estatuto da Criança e do Adolescente. Por meio das peças e brincadeiras, são mostrados conceitos e valores, um campo fértil para o aprendizado. “As crianças estão receptivas e aprendem com mais facilidade, de maneira divertida”, cometa Ana. A idéia cresceu e tomou forma de projeto que foi enviado à Fundação Abrinq. “Mandamos em 1999, o projeto voltou, fizemos ajustes e então passamos a participar do programa Crer para Ver”, conta Ana. O Crer para Ver tem como objetivo apoiar iniciativas e dar meios para a criatividade florescer dentro das escolas públicas. Uma contribuição da fundação à construção da cidadania. “Esticamos a verba que recebemos para o trabalho de um ano, para dois”, afirma a diretora. Atualmente, o projeto conta com apoio do Núcleo de Ação Educativa (NAE) e da Secretaria Municipal de Educação. Na prática – O Amorim Lima transformou-se em Oficina de Cultura Brasileira. Além da Oficina de Brincadeiras, os alunos das 3.ª e 4.ª séries ganharam aulas de dança popular, uma seqüência às brincadeiras de roda dos primeiros anos, acrescida de música ao vivo e movimentos coreográficos ligados às letras das canções. As aulas ocorrem às sextas-feiras, sempre no horário de aula. A coordenação dessa área é feita por Graça Reis e seu filho Téo, do Grupo Cupuaçu. O Cupuaçu é importante representante da cultura nordestina em São Paulo. Localizado no Morro do Querosene, onde os artistas se reúnem para preservar a memória das festas do bumba-meu-boi, o grupo tornou-se um núcleo de resistência e preservação cultural. “Ensinamos uma série de danças regionais como a cacuria, a ciranda, dança do caroço de Tutóia, entre outras. As crianças também têm a oportunidade de conhecer e aprender a tocar instrumentos regionais”, comenta Graça.
Mas não foi fácil vencer o preconceito de alguns pais. “Enfrentamos certa barreira criada por algumas pessoas que não entendem o significado da cultura brasileira. Então, tivemos de explicar claramente para familiares qual era a nossa proposta”, explica Ana.Nessa mesma linha, um jogo que certamente é um dos maiores expoentes da cultura do País: as aulas de capoeira oferecidas por Mestre
Alcides de Lima. A capoeira além de ser uma atividade física, exige muita atenção e disciplina por parte dos participantes, elementos que são assimilados pelos alunos. “Trabalho com a coordenação motora, sociabilidade, auto-estima e também com outras disciplinas, como história e geografia. Posso explicar o ciclo da cana-de-açúcar a partir da história da capoeira, por exemplo”, avalia Mestre Alcides. Para desenvolver a disciplina corporal, incentivar o respeito ao outro e estimular a concentração, os meninos recebem aulas de técnicas circenses fora do horário de aula. A coordenação fica por conta dos profissionais do Circo Nosotros. E, por fim, o músico Marcio Miele introduz aulas de musicalização. A escola já conta com um coral composto por 30 crianças da 1.ª à 3.ª série, que são acompanhadas, nas apresentações, por flauta doce. “Esse projeto pôde ser posto em prática por contarmos com o apoio da comunidade, que se dispôs a colaborar com a direção da escola”, elogia Ana. “Acredito que outras escolas possuem uma vizinhança interessada e talentosa como a nossa, é importante multiplicarmos essa proposta de reflexão e cidadania”, comenta Conceição. Todas essas atividades já fazem parte da vida da Escola Municipal Desembargador Amorim Lima, que deixou de lado a cara sisuda dos colégios tradicionais para ser um espaço de vivência. “Esse projeto já faz parte do currículo, quem quiser estudar ou trabalhar aqui sabe como funciona a escola e para nós todas essas ações têm sabor de conquista”, orgulha-se Ana.

Karla Dunder

Fonte: Agência Estado